Por Luiz Renato de Souza Pinto*
Bárbara é advogada. Ela diz não compreender o sentido que dou ao OK em nossas conversas digitais. Digo que o emprego de maneira diversa, conforme a situação. Com a sua insistência prometo dedicar uma crônica sobre o uso, a fim de me tornar melhor compreendido em nossos diálogos. Para ela, o uso do termo só se faz necessário para denotar alguma contrariedade. Confesso que a utilizo em meu cardápio de possibilidades.
Lembro da preocupação de Bárbara. Se a conversa flui de maneira inteligente, bacana, interativa e estou de acordo com o que vem de lá, o OK tem uma função didática que prescinde de maiores explicações. Está postulando um lugar ao lado do discurso com o qual concordo ao pé da letra, entende? Neste caso dizer OK significa que você se enxerga na fala de seu interlocutor, olha que coisa bacana!
Mas voltemos à fala de Oscar. “Somos las ruinas”; Walter Benjamin parece apossar-se de Guardiola que afirma ser a violência jurídica do estado responsável por essa limpeza (étnica), transformada em fantasia coletiva; em território francês (Le Pen), brasileiro (Temer) e Colômbia (Oribe). E lança um questionamento retrô: “ameríndios teniam alma? Europeus teniam cuerpo?”. Ao projetar uma Mona Lisa com aura indígena, como se fosse um cocar, fala em cópias e faz referência às imagens autóctones utilizadas por certo mimetismo de base aristotélica. Ok: agora me vêm à mente algumas telas de Irigaray.
Assistindo a uma das sessões de comunicação do GT “Direito, subalternidade e colonialidade”, pude apreciar a sensibilidade estética e analítica de Alice destrinchando em poucas palavras sua dissertação acerca da pesquisa com travestis nos presídios de Porto Alegre que expulsou de mim um poema na hora e pedi licença para declamá-lo àquela seleta plateia. Reproduzo aqui o texto:
ALICE EM UM PAÍS SEM MARAVILHAS
Ela me fala de Foucault
Como quem fala de um deus
Mas não é o que pensa
Apenas infere
O dom de se impor
Conceitualmente
Aqui
Agora
Ao falar do travesti
da travesti
o que é legal
e de direito
ela fala de mudança
de um estado de direito
que à força
do que se chama de justiça
padroniza comportamentos
e se enfeitiça
subalterniza
o diferente
é fato,
é direito
o que se faz a bom termo
como política de estado
e é apenas
política de governo!
Alice, como Bárbara, é advogada. Guardiola é professor de uma universidade londrina, no hemisfério norte. Somos todos frutos de nossos sonhos e possibilidades, mas nem por isso devemos deixar de alçar cada qual seus próprios voos. Queria com isso apenas dizer que podemos ser o que quisermos, onde quer que seja, okay?
Luiz Renato de Souza Pinto, escritor, poeta, professor e ator performático
Eu acho incrível seus textos por isso, por teletransportar para dentro da sua narrativa e tecer contigo os fios que enlaçam todo o significado do que você conta. Obrigada sempre, aprendo muito nessa leitura. <3