Por Luiz Renato de Souza Pinto*
O trabalho com a poesia em sala de aula é uma experiência ímpar para o profissional de educação. Qualquer que seja o nível de ensino, a viagem é pródiga de possibilidades, desde que se faça um trabalho sensível e inteligível, o que não significa necessariamente de grande porte intelectual. Sou da opinião de que todos somos inteligentes, embora uns desenvolvam mais do que outros essa potencialidade. Quando se debruça sobre a poesia, enquanto essência, um universo de abstrações e concretudes que são capazes de romper com limites estreitos de alternativas e possibilidades se abre ao prazer de experimentar esse vínculo.
Não penso na poesia apenas em sua forma escrita, mas como elemento holográfico que edifica em três dimensões uma arquitetura na qual se mergulham significantes e significados, no mais abrangente sentido imortalizado pelos estudos de Ferdinand de Saussure, lá pelas últimas décadas do século XIX, base da linguística moderna. A utilização dos cinco sentidos aliada a um conhecimento prévio das figuras de linguagem são linha de força desta proposta de que falo agora. A poesia enquanto dimensão sonora, materialidade escrita e construção rítmica.
Vejo toda uma dramaturgia da palavra construída em torno dos cinco sentidos. Essa dramaturgia contém em si parâmetros diversificados de som e luz, de ritmo e de cadência, de significantes sonoros e linguísticos, cor, sombra e outras implicações que transcendem a materialidade física de sons, ruídos e vozes, alcançando um resultado estético que em última instância se materializa pela comunhão dos sentidos. É do vigor da metáfora que se impõe esse destino da palavra poética; início e fim de uma viagem cíclica a que se propõe de maneira consciente, ou não, o ofício do poeta. Enxerga-se o som e seus prolongamentos sinestésicos: o espectador (leitor) adequa-se ao espaço do ator (o poeta/eu-lírico) e sente (leitor) o efeito sonoro da orquestração a vibrar por todo seu corpo (significados).
O universo da metáfora adquire força capaz de mover o pensamento estático do leitor para um campo imaginário em que fertiliza de maneira mais abrangente qualquer significante inicialmente mais raso. Entendemos como significante qualquer suporte que carregue um significado; pode ser sonoro, escrito, desenhado, ou mesmo uma profusão de formas. É claro que ao falar de figuras de linguagem não me refiro somente à metáfora, mas assim como a filosofia é a mãe de todas as ciências, a metáfora também o é, dentre as figuras de linguagem. E é desse prisma que parto para pensar o trabalho com poesia, que começa com o cheiro das palavras, passa por uma experiência com o seu peso e tamanho, com a urgência dos significados mais profundos, como também com o não dito, uma vez que o silêncio não é a ausência de som, nem o branco, ausência de cor.
Metáforas, metonímias, catacreses, personificações, sinestesias, elipses e paradoxos, antíteses e anacolutos; onomatopeias, assonâncias e aliterações trazendo colorido ao plano sintático-semântico, imagético e conceitual da produção de sentido. É necessário que o profissional em sala de aula tenha conhecimentos mínimos das figuras, como também de outros elementos constitutivos da construção poética para um bom desenvolvimento da proposta.
Como encontrar obras capazes de fornecer tantos elementos para o professor-atuador das redes pública e privada de ensino fundamental em nosso país? Esta é uma tarefa da qual o educador não pode fugir. Poetas como Cecília Meireles (Ou isto ou aquilo?), Vinícius de Moraes (Poemas Infantis), bem como músicos como Chico Buarque de Holanda e Adriana Calcanhoto, por exemplo, são facilitadores que podem contribuir com essa iniciativa.
*Luiz Renato de Souza Pinto é professor, poeta, escritor e ator.
Oi Luiz, você, como sempre, muito atento à poesia como um corpo construído de imagens e sons. Uma alegria imensa contar com sua leitura de professor especializado e poeta. Agradecemos!