Por Fábio Guimarães*
Minha agonia é o retrato
teu, pregado no silêncio antigo
da moldura muda,
a me fitar com tal desgosto.
E caem cachos
de recordações: teu rosto
embrulhado no indecifrável
olhar vestindo
a lua âmbar!
Vestindo a lua prata,
às vezes.
A lua rubra, outras.
Vestindo a lua para
o fascínio de meu olhar.
A amargura que desaba
é ter perdido em alguma
paisagem distante,
teu lábio de textura terna;
corados lábios a me incutir
ideias de bela vida!
É não ter riscado pistas
permitindo voltas, retornos,
reencontros, refazimentos…
Minha agonia é a cidade
envolta em costumes néscios.
O trânsito e suas faces anônimas,
apressadas, desinteressadas
pelas vidas ao lado escorrendo
em mesmo frenético ritmo.
Aquele cão de rua anêmico
e seu semblante de doer.
Uma sirene avisando ao trânsito
mórbido, carregar morte iminente.
(igualmente anônima).
O cão se ajeita sobre a calçada fria
com a tristeza do abandono.
(tão assemelhado a mim…).
Meu desespero é a densa hipocrisia
encharcando a cidade.
A pressa inútil de suas gentes sem préstimo.
(e minha vida equilibrando-se sobre essas indigências).
Queria retornar ao pátio
do colégio que passou em nós.
Ao pátio que acolhera
nossas mãos tímidas, excitadas,
suadas de amor…
Mas não deixei pistas:
nunca haverás de estar comigo!
Meu pesar, também é essa desatenção
cometida ao negar sinais do caminho
que se dirige ao meu refúgio.
Então, definitivamente, criou-se
a amarga conclusão:
não mais há pátio, colégio, luas.
Tudo fora lançado ao abismo
das lembranças que se estreitam,
rumo ao sem fim que me devora
pouco a pouco,
irreversível, irremediável.
Meu pesar é o pátio.
Sim. O pátio que ficou
pregado em minhas
retinas, com tua amada
forma fazendo mágico
o pátio e o colégio de
tempos idos.
Ah, como doem essas coisas
retiradas de minha alma.
Como dói. Como dói…
Minha tristeza são réstias
de luz ainda provocando
racionalidade em mim.
Como ouso possuir tino?
Como ouso?
Para aonde se dirige aquela
fisionomia cavalgando a pressa?
O destino é o de sempre.
(o de antes do agora).
Mas a fisionomia não sabe.
Não entende…
As coisas não se modificam
– salvo um falecimento.
Uma discussão – expondo sem rodeios
o eterno gosto pela discórdia.
Há o horror varrendo tudo. Mianmar.
As coisas não se modificam
– as pessoas se odeiam
desde o instante original.
Cobiçam a virtude do outro.
(encontra-se casualmente nesgas
de virtudes).
As pessoas odeiam a si próprias.
Estamos presos entre fronteiras.
Muros. Cercas – mesmo as imaginárias-,
são linhas divisórias.
Separam o outro do outro.
Decretou-se a extinção dos quintais:
plantaram pedras!
O asfalto é algo sórdido.
Logo eu, que nasci na poeira
vermelha e visitava todos os quintais.
Borboletas, cigarras.
Tardes morenas balançando o calmo
vento estival levando os pássaros!
Queria o pátio.
O colégio.
A alta lua.
Dizer: meu amor!
Depois, deixar o
tempo lacrado
nas bocas apaixonadas.
E depois, mais nada…
*Fábio Guimarães é poeta, advogado, professor universitário e defensor público em Mato Grosso.