CAPITULO XXXXXXXXX
As grossas e geladas gotas de chuva reverberavam sonoramente no vidro da janela. Através da cortina de água e luzes difusas podia-se distinguir a cidade parada, e poucas e ousadas pessoinhas lá em baixo arriscando-se em meio ao vento e às folhas que voavam incessantemente. Dos dois guarda-chuvas visíveis na rua, dois estavam quebrados. Levantei demoradamente, com os olhos inchados e a boca ávida. De cueca e (novamente) chinelos de pano, empenhei-me num esforço contínuo para chegar até a cozinha em busca da sagrada e também deprimente caixinha. Tomei dois comprimidos de Tylex e voltei para a cama. Mais ou menos uma infernal meia hora depois eu estava de pé. Pelo menos tentava. Na minha cabeça, exatamente acima dos olhos, dois macacos munidos de boinas pretas e pratos metálicos sorriam, enquanto seus olhos arregalados pareciam ficar maiores a cada seco e metálico tilintar dos pratos. Billy miou para mim e eu miei de volta, naturalmente. Abri a geladeira, agachei-me e procurei por algo lá dentro. Uma garrafa d’água e um pote de margarina. Na pia mesmo comi um pão francês com margarina, enquanto a água para o café fervia. Finalmente pude refletir sobre o incomum e bizarro sonho da madrugada anterior. E olha que eu não sonhava havia muito tempo antes dessa insólita demonstração de sonho. Li “A Interpretação dos Sonhos”, do Freud, há alguns meses, e sinceramente não me serviu de nada. Fiquei, talvez até o final do dia, remoendo internamente aquela questão e procurando alguma relação entre as mariposas e eu. A única que encontrei foi o fato de sermos ambos insignificantes. Só parei esse processo quando a vergonha e o cansaço atacaram-me e arrastaram-me novamente para minha cama. Tive um sono mais parecido com um desmaio, onde a escuridão foi tudo o que eu queria que tivesse sido: plena e livre escuridão.