Por fauno guazina*

aquele que inventou a culpa morreu de remorso

é insano questionar-se ao outro sobre as vontades do eu, mesmo naquelas que se tem vontade, de verdade a vontade. realisticamente o eu chamaria isso, em partes, de egoísmo e, romanticamente, simplesmente a mais pura entrega ao outro?! erre ou erre, o questionamento serve para dividir a responsabilidade, que os desejos sejam pré-aceitos e que é legítimo fazer, quase beira o consentimento. nesse aí se legitima o outro, introduz-se ele dentro de outras vontades, com o tempo coloca ele em todas as vontades, terminando por não se fazer o que de fato se tem vontade, sim o que é mediado, nem tão medido assim, nem ele, nem eu, nem nós. claro, também serve como passo reflexivo, que o outro espelhe o eu e seja contraponto, ponderação, terceira perna, tripé, estável. o que de ser humano é estável? o que de vontade é desejo e é legítimo? o que ou quem?

e… ao questionar o ou ao outro, se deve ou não, se pode ou não, a que ponto se entrega a própria existência, de que forma vc não é mais essência?! então agora vc é outro, não ele, mas outro eu que é para ele outro, daí se é aquele que o outro quer que eu seja, mesmo que isso seja bom as vezes, não que isso seja ruim, muitas vezes se quer ser para o outro o que o outro quer que eu seja, mas o outro se sente bem com a nossa presença junto à ele, o outro se sente bem em como eu faço ele se sentir, bem. assim, o outro se sente bem, ele não se sente bem por, mas pela gente, ele não pode descrever aquilo que a gente sente, ele também não pode sentir pela gente, não se tem como pedir que o outro se responsabilize pela felicidade de ninguém, a não ser a própria.

abstract art 5 by Pracha — Bangkok, Thailand

é bom?! é bom quando vc se sente bem depois, é bom quando o eu faz algo por si e que o outro não o responsabiliza de ter feito em detrimento de ferir ou sacanear ele. é bom quando o eu tem a liberdade de ser aquilo que é, mas isso implica em fazer escolhas, muitas vezes essas escolhas podem afastar ou ser indiferente ou aproximar o outro. quando e se o eu questiona se aquilo que irá fazer afetará o estar bem do outro o eu acaba entregando a responsabilidade da própria felicidade para ele. a que ponto nossas escolhas tem o poder de interferir no bem estar do outro. se o outro não deve fazer pelo eu as escolhas e não pode ser responsabilizado pelas alegrias, a não ser as próprias, então não deve ter poder de criticar ou desculpar o eu pelas ações que comete, crise!

abstract art 4 by Pracha — Bangkok, Thailand

quando eu sou eu me sinto bem, quando eu sou eu não sinto culpa, agora quando eu sou para o outro eu me culpo de tudo que o outro sente, tanto de bom quanto de mau, se ele fica contente eu fico contente por ter causado o contentamento dele, se ele fica mau eu sinto culpa por ter feito ele estar mau. mesmo em crise, isso não é o mesmo que entregar a ele o volante das vontades do eu?!

é a batuta do desejo que inicia a melodia, a orquestra das vontades, muitos instrumentos se tocam em sinfonia, o eu, tantas vezes outro, é ele e eu ao mesmo tempo, impossível de ser destruído, metrônomo da confusão, faz de mim outro, preferidor de tempestades, metamorfo, forma de fato e fato em forma, o eu assume este caminho, mais claro, mais óbvio, mais visível, bem menos escondido, quem sabe até mais honesto.

abstract art 2 by Pracha — Bangkok, Thailand

não sei se é sabido, mas, as vezes, as borboletas sentimentais dos eus se transmutam em verdadeiros centauros outros, força bruta de desejos nossos, humanidade dançando na mais veemente glória de animalidade, nada naturalizado, mas natural, uma borboleta negra pode se transsubstanciar em um gigantesco criolo puro sangue.

poder… pode, mas nem tudo é tão preciso assim.

NAVEGAR É PRECISO, VIVER NÃO É PRECISO
frase originalmente proferida pelo general romano Pompeu foi afamada por Fernando Pessoa.

*fauno guazina é produtor cultural, designer, professor universitário e urbanista.

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