A rua de cima, a rua do meio, a rua de baixo. Cuiabá e suas ruelas, vielas, que se estendem em paralelepípedos, contrastam o antigo e o novo. O atrito das rodas no concreto reflete todos os anos que se passaram. E neste recorte do tempo estamos sentados na Praça Alencastro em Cuiabá. É domingo. O relógio da Catedral marca o compasso dos ponteiros. Ele chega de skate e se senta para gravar conosco. A primeira pergunta é: como você começou a fotografar?

Aos 10 anos de idade, Diego Almeida já “brincava” com a câmera. Sem pretensão, com amigos, começou a fazer aquilo que se tornaria sua profissão. Mas, a união dos dois lados da sua vida aconteceria muitos anos depois, quando havia apenas uma vaga na van para um campeonato de skate em Rondonópolis e Diego precisava participar de alguma maneira.

Samuel Jimmy - Foto: Diego Almeida
Samuel Jimmy – Foto: Diego Almeida

“Eu nunca andei de skate para campeonato, só para brincar com a molecada e queriam me cortar porque só tinha uma vaga e eu tinha que fazer alguma coisa pra participar. Descolei a câmera e não fui pro campeonato, mas comecei a fotografar a molecada na rua. Comecei a fotografar justamente por causa do skate”.

Eu por eu mesmo
Eu por eu mesmo – Foto: Diego Almeida

E assim, skate e fotografia passaram a caminhar lado a lado. Suas fotografias são de rua e circulam pelo Brasil na exposição “Fotos de Gaveta” que iniciou em Curitiba e passa por São Paulo e Rio de Janeiro. Diego tenta trazer a exposição para o Centro-Oeste, por ter sido o único fotógrafo daqui selecionado, e o único profissional de skate em Mato Grosso, a expectativa é poder agregar outros nomes conforme o coletivo roda o país.

“Essa exposição é organizada pelo Alessandro McGregor skatista profissional da década de 90, que mexe com projetos voltados pro skate, e é um coletivo. A conexão com a molecada de Curitiba, com este pessoal que movimenta aquela parte, que começou esse movimento, com fotógrafos de todos os lugares do Brasil e conforme for circulando entram mais pessoas. Foi bem legal de estar nesse primeiro momento, ser chamado agora, tem outros fotógrafos que eu esperava que fossem chamados e eu não. Estão valorizando quem está fora do eixo, fora do grande centro SP, não tem esse boom do skate aqui, acho que até por isso rolou o convite”.

Carlos Dudu - Foto: Diego Almeida
Carlos Dudu – Foto: Diego Almeida

A luta é diária, afirma Diego sobre as dificuldades enfrentadas pelos skatistas. Em Cuiabá principalmente, falta estrutura e apoio, além de ser a única capital do país com apenas uma pista de skate.

“Até para os skatistas daqui, tem que sair para fora para conseguir algo, tem poucas skate-shops e Cuiabá é a única capital do Brasil que tem só uma pista de skate, e ainda assim não tem qualidade para galera desenvolver bem. Quem vive o movimento aqui é um guerreiro de estar na rua, até por isso viajo bastante pra fazer as fotos”.

Jhon Douglas - Ollie - Foto: Diego Almeida
Jhon Douglas – Ollie – Foto: Diego Almeida

Ele explica que o movimento aqui é forte, mas não existe nada de concreto para quem anda de skate. “É muito bom estar na rua em Cuiabá, aqui é tranquilo andar de skate, diferente de Brasília que a polícia, seguranças, ficam em cima. Aqui tem muito pico de rua, é muito fácil estar na rua, mas isso é pouco explorado. Ao mesmo tempo que é muito bom estar aqui, é muito difícil, porque mercado praticamente não existe”.

Antes, era proibido andar de skate na Praça Alencastro lembra Diego. “A galera tirava placa que tinha de proibido andar de skate, era vandalismo mas era necessário, e hoje a molecada tem esse espaço para andar, e poucas cidades tem isso. Muitas pessoas não dão valor, porque não viveram esse momento, receberam tudo de certa forma, mastigado”.

Foto: Diego Almeida
Foto: Diego Almeida

As conexões com todo o Brasil são necessárias para firmar Cuiabá na cena do skate e por isso Diego trabalha para que este intercâmbio aconteça. “Consegui trazer algumas pessoas para cá como o Samuel Jimmy e o Maurício Nava, e as pessoas se interessam porque Cuiabá está fora dessa rota onde tem esse ‘boom’ do skate”.

Rodrigo Laroqui - Foto: Diego Almeida
Rodrigo Laroqui – Foto: Diego Almeida

A ocupação dos espaços da cidade pelo skate é revitalização. Para Diego, ocupar e movimentar os lugares através do skate é gerar vida. “Um lugar que estava desativado e morto começa a ser frequentado pela galera”.

E esta é apenas uma das lições de vida que o skate proporciona.

“O skate tem esse poder de mudar a vida das pessoas, mudou a minha, me deu uma profissão, me ensinou a ter respeito pelo próximo, me ensinou muita coisa na verdade. Tem vários exemplos de superação, cada dia o skate proporciona isso a quem está no movimento, é uma coisa de a cada dia estar evoluindo, então eu acompanho isso diariamente, a cada rolê que eu tô, eu vejo isso de superar o limite e chegar ao máximo que conseguir. Eu comecei a me interessar não só também por fotografia, como por propaganda, design, por outros focos e foi o skate, se não fosse o skate eu não seria hoje o que eu sou, sei lá o que eu estaria fazendo”.

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Marianna Marimon, 30, escritora antes de ser jornalista, arrisco palavras, poemas, sentidos, busco histórias que não me pertencem para escrever aquilo que me toca, sem acreditar em deuses, persigo a utopia de amar acima de todas as dores. Formada em jornalismo (UFMT) e pós-graduação em Mídia, Informação e Cultura (USP).

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