Por Maria Clara*

Quem me conheceu na faculdade sabe que eu piro em rádio. Na semana passada, conheci por dentro o da Assembleia Legislativa de Mato Grosso. Conteúdo antenado, resistente, de primeira. “Jornalismo cultural em tempos digitais” foi a pauta do Fusão[ponto]com.

Repórter em posição de entrevistado tende a ficar acuado, Lidiane Barros bem lembrou. Aliás, falar nem sempre é fácil para quem se conforta em escrever. Mas um tema daquele, conduzido por um artista comunicador visionário como Eduardo Ferreira, virou papo pra bar. Túlio Paniago, no ar, nem se acanhou em sugerir.

Sobre a entrevista, deixo pra íntegra. O que me mobiliza a escrever são as ondas sonoras, hoje convertidas em conjuntos de códigos binários. Passei a pensar nessa mágica digital depois d’A Voz da Ocupação.

O boletim informativo da greve estudantil contra a PEC do Fim do Mundo foi um puta instrumento de mobilização e registro do movimento deflagrado na UFMT em 2016. A experiência resultou no meu único artigo acadêmico publicado durante a graduação. O parto de 13 páginas de reflexões teóricas em um prazo de cinco dias não foi, de longe, intenso como escrever e enxugar, enxugar e enxugar, durante longas madrugadas, amadoras laudas de 11 edições.

A greve e ocupação do Instituto de Linguagens (IL) pelos estudantes de jornalismo, radialismo e publicidade, aprovada em assembleia por ampla maioria, foi um posicionamento, àquela altura, radical. Como há tempos não se via. Mas e depois? Como comunicar um episódio histórico em um campus dividido entre ocupa e desocupa? Tomemos a Rádio Corredor!

Até então, não sabíamos, porém, que o equipamento da Faculdade de Comunicação e Artes (FCA) seria pouco. A estrutura do laboratório e o desconhecimento da técnica nos fez rever as estratégias. Além disso, usar apenas a Rádio Corredor limitaria o alcance do conteúdo ao IL, o que contradizia a ideia de difundir o movimento para o máximo de espaços, dentro e fora da universidade. A ideia também era promover a integração entre os grevistas dos diferentes institutos.

Um gravador de IPhone, um notebook com Sony Vegas, duas vozes para as locuções e um corredor silencioso qualquer. Foi o que bastou para o meu, o seu, o nosso programa: a voz da ocupação!

Com o acúmulo de tarefas de rotina do movimento, a espera pelo fechamento da programação do dia seguinte e pela apuração dos acontecimentos até́ as últimas atividades, a produção das laudas acontecia até altas horas por duas mãos. O áudio gravado editado por uma terceira. O boletim deveria estar pronto antes do raiar do dia para serem distribuídos em grupos de WhatsApp, no YouTube e Facebook, e ecoar nos blocos até às 7h30 da manhã. Disciplina (quase) bolchevique. Vez ou outra um soldado capotava no sofá entregando o corpo aos pernilongos do saguão. O guarda amigo dizia que parecíamos “aqueles jovens dos anos 60”. Provavelmente dos anos 70, 80, 90 e 2000 também.

Radiojornalismo ou audiojornalismo? Pouco importa.

O rádio, ao menos nos moldes tradicionais, não é minha principal fonte de informação, tampouco parte das minhas experiências profissionais de foca. Não se lê um relato especialista. Mas essa breve, experimental e intensa vivência no movimento estudantil mostrou que as mudanças de formato e transmissão do produto fonográfico apontam caminhos interessantes não só para a música, descoberta da geração passada, mas para o jornalismo em tempos de convergência. O rádio saiu da caixinha e não tem nada de passado: é o futuro!

 

*Ouça a experiência d’A Voz da Ocupação no link abaixo:

https://www.youtube.com/channel/UCpVEde05uqamLPKYG74Mj_w/videos


Maria Clara é jornalista em Cuiabá, escreve crônicas, poemas & afins

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