Por Marta Cocco
Ontem
no caminho de volta
para casa
registrei a falta do sol
na minha esfera de horizontes.
Não era ausência!
Algo do mundo das trevas ofuscava seu brilho.
Provavelmente,
para deixar encoberta
sua firma reconhecida de morte.
Que lástima esse percurso.
Na beira da pista
bichos que escapavam
cambaleantes das labaredas
sucumbiam, por fim,
à velocidade dos carros.
Que lástima esse percurso!
O fogo não sabe ser discreto. Quer converter toda matéria na sua sinistra predileção: carvão e cinzas.
E não por falta de aviso. Lucinda vem dizendo “todas as vezes”.
(O diabo e sua panela sem tampa).
Calar é entregar-se a
esse plano das trevas que almeja a submissão dos vivos.
Que lástima esse percurso.
A não ser pelo arranjo de algumas flores avulsas, marcando de amarelo a paisagem textual tão esmaecida e dirigindo minha leitura para o inevitável:
em pouco tempo farei 54 anos e já está na hora de perguntar:
o que ficou para trás?
O que haverá pela frente?
(Tangará da Serra, 09/09/2020, dedicado à Lucinda Persona, que já escreveu muitos poemas sobre isso.)
Marta Cocco é escritora e professora de Literatura.