2018, 1º de abril. Domingo de Páscoa.
Baía do Chacororé transbordando vida. A beleza da paisagem se abre a minha frente, nuvens tocam o espelho das águas refletindo luz.
Estamos no Pantanal, santuário da flora e fauna.
Paraíso escondido por detrás das matas que circundam a baía.
Águas do encantado, refúgio de Glória Albues, onde passamos momentos únicos, observando jacarés travessos saltando ligeiros para abocanhar as sobras da pescaria lançadas de dentro da canoa.
Pássaros se atiram do topo das árvores em voos rasantes sobre as águas.
É tanta vida na planície alagada, é tanto verde e cores na floração delicada que flutua, pétalas rosadas e lilases, como joias brilhando na manhã perfumada, que nossos sentidos se embriagam em êxtase.
2019. 1º de abril. Terça-feira. Dia da mentira.
Parece mentira que o mundo virou do avesso. Uma onda de intolerância e ódio toma conta de tudo. Os olhos do mundo se voltam estarrecidos para uma Amazônia incendiada. Desastres ambientais de proporções enormes se sucedem.
Denúncias caem no vazio da ignorância. Populações indígenas e ribeirinhas impactadas pelo avanço cruel, predador e inexorável do poder financeiro. Tudo pelo dinheiro. Rios contaminados de mercúrio. A volta grande do Xingu está morrendo. Tragédia anunciada na construção de Belo Monte.
Agosto desgosto. As praias do Brasil inundadas de óleo. Negro e sufocante óleo devastando a vida marinha. Derramamento de petróleo cru sem precedentes. A mancha de óleo atinge vasta extensão do litoral, e segue meses a fio para o desespero da população despreparada.
Parece que nada pior ou tão dantesco pode ocorrer em nossas vidas.
Triste engano.
2020. 1º de abril. Quarta-feira. Dia de pandemia.
Abrem-se as portas do inferno. As unidades de saúde extrapolam sua capacidade de receber organismos doentes. O mundo está em choque. O mundo está em suspense. Portas fechadas ruas vazias. Toque de recolher. As covas abertas na terra voraz recebem os mortos. Centenas. Dezenas de milhares. A pandemia prossegue seu curso devorando vidas. O mundo está enfermo. Ardendo em febre.
Maio. Junho. Julho. Agosto.
Mal gosto. Desgosto. Incêndio sob o céu carregado de dor. A floresta queima. De novo. Não nos surpreende dessa vez.
Mas, outra tragédia se desenha, no Centro-Oeste do Brasil, a maior planície alagada do mundo, o Pantanal, nosso santuário natural, abrigo de múltiplas espécies, está seco. As águas se foram, deixando sobre o solo a massa comburente da vegetação morta.
No horizonte observo, de longe, durante a madrugada insone, o céu rubro negro a sudoeste, são as chamas gigantescas de um incêndio monstro. O fogo devorador salta barreiras hidrográficas. Se expande incontrolável e devastador, calcina o solo, fumegante. Animais, árvores e gente que padecem. A morte toma conta da paisagem. Carcaças esturricadas jazem em meio a terra rachada.
O Pantanal torna-se um cemitério a céu aberto. Os registros da tragédia estão expostos nas fotografias que nos revelam um cenário apocalíptico.
Cuiabá está envolta em cinzas e fumaça do Pantanal e do Cerrado agonizante. Mato Grosso queima. Nossos amigos ambientalistas ativistas combatem o fogo frente a frente. Uma batalha dura e cruel, onde é difícil saber o que pode ser salvo.
Nesse momento minha alma é uma onça ferida pelo solo em chamas. Uma onça que chora e rasteja e já não pode andar. Que sucumbe a dor entre tantas mortes.
2020 encerra seu ciclo de dias.
No entanto as sequelas da tragédia estão visíveis na paisagem devastada.
2021. 6 de janeiro. Dia de Reis.
Vejo a notícia que me bate a porta.
A baía do Chacororé secou.
Não posso crer.
Onde antes as águas doces corriam, espalhando-se em ondas brilhantes de um universo aquático, vê-se apenas, até aonde a vista alcança, um verde novo de ervas rasteiras que brotaram com as poucas chuvas.
Vacas tranquilas inocentes pastam, abrindo trilheiros por onde antes jacarés nadavam.
O que meus olhos viram um dia já não podem ver.
Penso.
Paro.
Meu Deus,
oh céus,
para onde vamos,
para qual futuro,
Incerto e inquietante?
O tempo dirá.
O tempo será.
Mas será que teremos tempo?
Agora a culpa é da usina de manso. Para beneficiar produtores de gado foram fazendo barreiras que impediam o abastecimento da lagoa. Como foram os incêndios criminosos ns regiao.como esta sendo a destruição de pocone com o garimpo, dessa invasão cada vez maior das áreas indigenas pelos garimpos e pelas lavouras da monocultura da soja,milho…. cadê SEMA,IBAMA