Na saída do supermercado, com as compras na mão, deparo-me com ele. Chegou chorando.
Chorando muito veio na minha direção. Não consegui desviar. Algo me atraiu naquele choro. Ele era um estranho, nunca o tinha visto, apesar de parecer um monte de gente que já vi por aí. Não consegui deixá-lo ainda mais só.
-O que aconteceu?
Ele passou a mão no rosto como se o gesto fosse capaz de tirar aquele choro de dor, e apenas balbuciou. Um homem de baixa estatura, de 60 e poucos anos, talvez. Cabelos grisalhos e ralos.
-Meu amigo morreu! Morreu dessa maldita doença empesteada. Essa tal de Covid…
Penso que essa “tal de Covid” já tá mesmo bem famosa. Não se fala de outra coisa. O choro daquele homem me tocou muito.
-Pode contar comigo nesse momento de dor. Estou com você, pode falar…também estou sentindo essa dor. São muitas perdas, um autêntico naufrágio de navio sem comando.
Lembro-me da canção que sempre relembro e cito, do cancioneiro violeiro, André Balbino: “não se preocupe, está tudo sob descontrole…” Se a gente pensar bem, é isso mesmo. Quem controla o quê? Na hora H o trem desgoverna. Assim é o movimento dos corpos em todo o Cosmos e escalas com seus acidentes entre as harmônicas.
Notas musicaes caem sobre minha cabeça subitamente. Recupero a música que havia perdido nessa manhã em que me sinto tão bem. Mas aquele choro não me sai da cabeça. Deu vontade de dar um abraço solidário naquele senhor cuiabano que tanto chorava a morte do amigo. Ele apontava para o celular como a confirmar a notícia.
-Acabei de receber a ligação confirmando a morte dele. Menino de 30 anos, era como um filho para mim. Hoje é terça-feira? Estive com ele sábado passado, bebemos e conversamos. Não é possível!
Nessa hora não tem o que falar. Só fiquei a ouvir. Enquanto guardava no carro umas coisas que comprei no supermercado.
A atenção que você deu a ele com certeza valeu mais palavras.