Fábio Pinheiro

os bons dias se seguem

como contas no rosário

tento sorrir

apesar do aperto no peito

que não se desfaz

com o pesadelo que tive

com Valquíria

 

uma aba de carne exangue

a balançar

 

ainda sinto nos dedos

a carne tépida sob o pelo

uma indescritível impotência

a gente não pode ter as pessoas

cá dentro

nem os sonhos

ousam trazer ideias de abrigo

 

os bichos morrem cedo

e somem em meia hora

afasto o pensamento

e escrevo celebro

todo e cada momento

mesmo quando desejo o fim

 

eu não queria que ninguém mais morresse

a morte é um ultraje

se agarra aos cantos da parede

escorre na pia

se opõe à luminosidade das faces

apaga a brasa do cigarro

e deixa o eco dos risos como zombaria

isso não é certo

 

há de haver uma frase

uma droga que se toma

e apaga o esquecimento

quando eu te abro

eu vejo vermelho

que grita o agora

não pensa só assim

pra se tornar maravilha

 

Fabio Pinheiro é poeta, professor e cidadão do mundo, daqui até Hades

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