Quando pensamos em Liu Arruda, logo lembramos de seus personagens icônicos, como a comadre Nhara e o seu Juca, de suas peças bem sucedidas e de seu bom humor. No entanto, este trabalho teatral insere-se em um período de mudanças em Mato Grosso, mudanças estas que mexeram com a autoestima, dentre outras coisas, dos cuiabanos. Este é o tema do livro “Liu Arruda: A travessia de um bufão”, de Ivan Belém, que será publicado pela Carlini e Caniato Editorial.
A obra conta a história de Cuiabá na década de 1980, inserida no contexto global, tomando como referência a trajetória artística de Liu Arruda. “Esse foi um período de grandes mudanças. Mato Grosso recebeu uma leva de imigrantes à busca de terras para a exploração na agricultura, ocasionando um choque cultural, no qual a cultura cuiabana, sobretudo o nosso sotaque, sofreu tremenda perseguição, sendo tratada como algo menor, feio, exótico”, explicou Belém.
“Liu Arruda: A travessia de um bufão” começou como tese de doutorado. Apesar de classificada como biografia, não se atém a detalhes íntimos da vida de Liu Arruda. “Como se trata de uma tese, temos sempre que nos debruçar sobre um problema. O problema que coloco é descobrir e anunciar como o teatro interviu sobre a realidade de Cuiabá neste período, quando se vivenciou, em escala global, um acirramento da homogeneização com repercussão em todas as instâncias da vida individual e coletiva”, disse o autor.
O escritor ressalta que esta foi uma época em que os cuiabanos sentiram-se humilhados e inferiorizados, envergonhados do seu pertencimento. E é neste momento que entra em cena Liu Arruda e o Grupo Gambiarra, fazendo um teatro popular, profundamente político, com encenações nas ruas e um sotaque essencialmente cuiabano.
“Procurei identificar como esses jovens atores e atrizes, tendo Liu Arruda como um ícone, atuaram sobre esse momento histórico vivido por Cuiabá. O que trouxe esses imigrantes para cá? Que impacto esse encontro de culturas ocasionou? E como o teatro agiu diante de um conflito cultural, neste caso, a perda de identidade, já que nesse momento o comportamento dos cuiabanos sofreu severas críticas dos recém-chegados, causando nos primeiros um constrangimento quanto ao seu modo de ser e estar?”, acrescentou.
O livro é uma das dez obras vencedoras do Prêmio Mato Grosso de Literatura. O lançamento oficial, promovido pela Secretaria de Estado de Cultura (SEC), está marcado para o começo de abril. Ivan Belém também pretende fazer outro evento em um teatro de Cuiabá e na Casa Azul, em Chapada dos Guimarães.
Sobre o autor
Ivan Belém, 55 anos, nasceu no município de Barão de Melgaço, Mato Grosso. Aos 17, já publicava crônicas em jornais. “A coisa mais linda que aconteceu na minha vida foi aprender a ler”, disse Ivan. Além da literatura, dedica-se ao teatro, ao serviço público e à gestão da Casa Azul. É também autor de “A Baía de Tchá Mariana. Mitopoeticas africana e pantaneira nos círculos de aprendizagens ambientais”.
* Stéfanie Medeiros / Assessoria