Por Rodivaldo Ribeiro*
Noite passada, eu finalmente consegui sonhar. Vi-me de repente parado à beira de uma montanha. À minha frente, um abismo imenso se desenhava. À volta, em cima e atrás, um labirinto mostrava-se a única saída possível. Envolto em um suspiro profundo, finalmente entendi meu destino. Era um labirinto sim, mas não como outros, resolvedor de quebra-cabeças e equações que sempre fora, a desafiar-me agora a existência. Em seu centro, um monstro mais pavoroso e faminto que o próprio Minotauro aguardava; as ventas de sua cabeça ancestral a aspergir fogo por todos os lados. O diagrama daquele local só fascinava pelo que tinha de apavorante. Feito em três dimensões, era adaptativo. Assim que percebe a presa encontrando a trilha, ele se reconfigura. Sempre aleatório, pode conduzir quem nele entra a infinitos novos rumos, incontáveis novas rotas, todas prontas a levar àquele que ao meio aguarda, os sons tenebrosos dele cada vez mais perto. Uma única saída em confronto com qualquer probabilidade matemática. Menos que uma utopia. Obrigado a escolher entre abraçar o abismo ou retornar ao enigma, lembro do pior. Minha princesa foi embora com o novelo, a única maneira de tentar marcar algum caminho… Se Teseu tinha Ariadne, eu nem mesmo Oráculo possuía mais. O que restou é o de sempre. Fingir ser forte e criar logo uma rota segura. Agora, além de entender, aceito meu destino — preciso ganhar tempo rodando, talhando com pés e mãos trilhas, de modo a evitar o centro do labirinto, onde o maldito monstro ruge, se debate e baba à minha espera. A jornada vai me transformar, mas também ei de a transformar. “O caminho é o verdadeiro fim; mais que o chegar”. Foi esse o grito, muito além do corpo ensopado, que me despertou.
*Rodivaldo Ribeiro é jornalista, radialista, vocalista e ativista underground, um dos fundadores da CUFA (Central Única das Favelas) em Mato Grosso, ganhava concursos de redação escolar, mas na adolescência, passou a desprezar prêmios e a queimar sua produção literária. Algo de que se arrepende até hoje.