O direito à informação faz parte de nossas garantias constitucionais. Não existe sociedade livre sem acesso à informação. Não só como consumidor mas como produtor. Vivemos hoje uma explosão de informações que torna-se cada vez mais necessário conhecer ou reconhecer os caminhos para uma boa checagem nas fontes que geraram o conhecimento dos fatos. Nunca se produziu tanta informação falsa. Nunca ecoaram tanto.

É o tempo das fake news, é o tempo da opinião, é o tempo de achismos e perdidos. Desculpe o trocadilho infame. Sim, todo mundo acha, todo mundo está perdido. Todo mundo, fake news, pós-verdade, são termos recorrentes na cena contemporânea de tantas conexões e isolamentos. Reduzir o discurso, ou a narrativa ao termo “todo mundo” não quer dizer nada. Todo mundo é ninguém. É o tempo dos opostos, nunca estivemos tão conectados, nunca estivemos tão sós. E daí? Você me pergunta. Digo quase sempre que não tenho respostas. As coisas estão sempre em mutação. Então concluímos que nada é sólido. As certezas são líquidas.

O jornalismo surgiu com as cidades, com o conceito de cidadão, com direitos que implicam em conquistas dentro do estado democrático que pressupõe escolhas, o direito ao voto, à cidadania, o direito de saber como se comportam os poderes. Na democracia deve-se prestar contas de seus feitos.  Cabe ao jornalismo, desvendar, revelar os males feitos.

O professor Eugênio Bucci, em excelente palestra no 1º Seminário de Comunicação Pública da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, jogou luzes em nossas cabeças tensas de funcionários a serviço de estruturas públicas de comunicação. No meu caso, a Rádio Assembleia. Mas, o que é comunicação pública? Como separar o público do estatal, do privado, dos canais comerciais que também são concessões públicas? Portanto tem que prestar contas sim do seu papel enquanto mediador das relações sociais, culturais e das necessidades da sociedade. Se é uma concessão pública, deve-se satisfação ao público.

O público de hoje já não é mais só consumidor de informação e entretenimento. O público é meio e fim de qualquer produção de comunicação em qualquer instância. Vivemos o tempo do cara que produz e consome informação, o chamado “prosumidor”.

Foto: Edmar Mauricio Barbant

Existe uma responsabilidade pública de todos os veículos de radiodifusão, TVs e rádios, sejam elas estatais, educativas, comerciais, comunitárias, seja qual for sua esfera de concessão e de atuação. Elas são um bem público concedido para exploração comercial e todos sabemos muito bem como funciona. Infelizmente os critérios para a distribuição de canais de transmissão não atendem as demandas sociais, econômicas, políticas e culturais que formam o corpus social. Predominam os interesses políticos imediatos, fisiológicos, eleitoreiros e todo tipo de barganha. Infelizmente não se consegue regular o interesse público e o desenvolvimento humano com o sistema político que é predador, controlador, de visão limitada, estreita e centralizadora, a ferro e fogo. A mão do poder sufoca e aniquila com as possibilidades de êxito de muitos, do outro.

O jornalismo está longe de salvar o mundo mas é um instrumento poderoso de salvaguardar o direito à informação. Em que pese o Brasil ser um dos campeões em agressões e assassinatos de agentes da imprensa. O jornalismo investigativo é um incômodo para as travessuras de agentes políticos, homens de negócios e controladores da riqueza produzida no país. Denunciar erros e condutas ilícitas nos negócios de estado, ou de governos, é um dever e uma atividade de alto risco para um jornalista. Segundo a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF), o Brasil ocupa um triste lugar de destaque no ranking dos países mais perigosos para o exercício do jornalismo: é o 2º mais violento da América Latina, atrás apenas do México.

Mas aí nos deparamos com a questão, jornalismo a serviço de uma instituição legislativa, como deve ser? Como se comportar com a informação e não se ater a se tornar uma mera peça de propaganda? Fala-se muito na necessidade de prestação de contas do parlamento, com seus integrantes, parlamentares e demais funcionários, terem a necessidade de dar publicidade a seus feitos. Mas um canal de radiodifusão não é só isso, ele deve promover a cultura, estabelecer a possibilidade do debate, da reflexão, de trabalhar informações que também fazem parte do escopo social. Os temas que estão aí no dia a dia de todos.

Foto: Edmar Mauricio Barbant

Como fazer comunicação pública sem ficar refém da impossibilidade da isenção, o mito do jornalismo isento? Ah, mas quase ninguém acredita em isenção. Todo veículo de comunicação está atrelado ou ligado umbilicalmente a algum grupo, seja econômico, político, religioso, da indústria do entretenimento ou qualquer outro. Toda redação está sujeita a diretrizes ou matrizes ideológicas ou correntes políticas ou, ou, ou.

Resta o jornalismo independente, único jeito de encontrar mais espaço para fazer um jornalismo ético e, de fato, de interesse ou relevância pública. As novas mídias estão aí para provar que sim, existem formas de se trabalhar isso. Existem exemplos, e um dos mais contundentes talvez seja do pessoal do Mídia Ninja que pratica um jornalismo online que está dentro da notícia, caminhando lado a lado com os fatos, e sempre em uma perspectiva colaborativa, descentralizada, onde os agentes são portadores de veículos portáteis, com câmeras transmitindo em tempo real em imagem vídeo e som.

Hoje são muitos olhares e muitas vozes reverberando, noticiando fatos e criando versões e narrativas no jogo das disputas de poder. Sim, linguagem é poder e tem o poder de reverberar, se multiplicar, fazer agir e se mobilizar pelas causas que interessam a todos nós. Não existe neutralidade nesse campo da informação, das ideias, do conhecimento, do jogo que jogamos em nossas vidas em sociedade. Cada olhar é um ponto de vista, capaz de revelar uma interpretação de mundo.

“Um repórter não é uma pessoa especial. Um repórter é qualquer cidadão que queira ter acesso a notícias e repassá-las”, já comentou Oh Yeon Hon, o criador de um dos maiores sites de jornalismo colaborativo, o Ohmynews que existiu entre 2004 e 2010 na Coréia do Sul, os arquivos ainda estão disponíveis. Overmundo no Brasil também foi pioneiro e bem sucedido dando vez a um Brasil invisível. Wikipédia, enfim…Os quase dois bilhões de usuários do Facebook, por exemplo, produzem informação diariamente. Mas o que importa aqui é debater imprensa e sociedade mas principalmente na perspectiva da comunicação pública.

Foto: Edmar Mauricio Barbant

“Imprensa é divergência, é oposição, é minoria política. Imprensa existe para revelar o que o poder quer esconder.” Diante dessa afirmação do prof.  Eugênio Bucci, fiquei a refletir sobre o papel do assessor de imprensa: assessoria é jornalismo? Em meu entendimento, não! Sempre refutei a ideia de jornalista-assessor. Entendo a função mais como relações públicas, mediador de um mandato com o público, com pegada de marketing e tals. Bucci coloca a questão e se diz refratário também e acha que assessoria não é jornalismo. Ele definiu assim em um artigo brilhante:

A profissão de jornalista tem como cliente o cidadão, o leitor, o telespectador. Nesse sentido, o jornalista se obriga – em virtude da qualidade do trabalho que vai oferecer – a ouvir, por exemplo, lados distintos que tenham participação numa mesma história. Ouvir todos os envolvidos, buscar a verdade, fazer as perguntas mais incômodas para as suas fontes em nome da busca da verdade é um dever de todo jornalista.

O assessor de imprensa, cuja atividade, eu repito, é digna, necessária, ética e legítima, tem como cliente não o cidadão, não o leitor, mas aquele que o emprega ou aquele que contrata os seus serviços. O que o assessor procura, com toda a legitimidade, é veicular a mensagem que interessa àquele que é o seu cliente, àquele que o contrata, e não há nada de errado com isso. É um ofício igualmente digno, mas não é jornalismo. A distinção entre os dois clientes estabelece uma distinção que corta de cima a baixo os dois fazeres.

Mas ele cita Ricardo Kotscho, super jornalista brasileiro do primeiro time que diz que sim. Escreveu em um artigo também ‘Não é a função ou o cargo que faz o profissional, é o contrário: em qualquer cargo ou função, seja numa redação ou numa assessoria de imprensa, a nossa ética tem que ser a mesma. Era assim que pensava e agia quando trabalhei como Secretário de Imprensa no governo (governo Lula). Nós, afinal, prestamos um serviço ao público, para o conjunto da sociedade, e não para quem eventualmente nos paga o salário, seja uma empresa privada ou o governo.

Essas questões foram corajosamente debatidas no seminário que a Assembleia realizou e que contou com presença significativa de profissionais de comunicação de Mato Grosso de TV, rádio, impressos, digitais, todas as formas de mídia. Os debates trouxeram luzes para questões que permeiam a cabeça de vários profissionais que trabalham comunicação de governo, legislativa, comunitária, privada, enfim, no universo profissional da comunicação, jornalistas radialistas, técnicos, assessores diversos. Kotscho diz também: ‘Não devemos nunca confundir divulgação jornalística com propaganda, um erro muito comum em todos os meios e latitudes… Jornalismo é, por natureza, uma atividade crítica, investigativa, que procura denunciar o que há de errado para que seja consertado.

Foto: Edmar Mauricio Barbant

Voltamos à questão do papel da imprensa. Na rádio Assembleia, por exemplo, além de dar transparência às ações dos parlamentares e da casa em geral, trabalhamos com um viés fortemente cultural, promovendo a cultura mato-grossense e fortalecendo segmentos como a música com uma ampla cobertura e inserção da música local na grade de programação; no teatro, entrevistando, debatendo e divulgando; na cultura popular; no cinema, enfim um vasto repertório cultural para gerar interação e trocas de afetos, de práticas culturais e saberes.

A palestra e o bate papo com Alexandre Pereira Tondella, diretor da TV e rádio Cultura de São Paulo e com a professora Sônia Virgínia Moreira, professora da Uerj, estudiosa de rádio, num painel debatendo o papel do rádio na sociedade contemporânea, foi bastante produtivo e se transformou em troca de práticas e vivências.

Todos foram unânimes em afirmar que hoje em dia a mídia caminha definitivamente para a convergência digital. É inevitável. Os meninos de hoje já nascem com as ferramentas na mão, são nativos digitais, as novas gerações que já nascem conectadas.  Com um simples aparelho na mão, filma, grava sons, fala, escreve, desenha, faz arte design, com a naturalidade com que tomamos um copo dágua. O futuro já chegou e mora ao lado.

 

 

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