Por Luzo Reis*

Agradeço o convite do Cidadão Cultura para falar um pouco da minha experiência de mochileiro na Bolívia nas últimas férias, em janeiro deste ano.  Fiquei pensando a melhor forma de fazer esse relato e resolvi contar um pouco da experiência a partir das fotografias que fiz, um fotodiário. No caminho vou dando algumas dicas para quem tiver afim de conhecer esse riquíssimo país, sem fazer as mesmas merdas que a gente!

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Iniciamos nossa viagem partindo para Corumbá-MS, fronteira com a Bolívia. Viajei na companhia dos amigos Léo, carioca, e Fred, Francês. Um terceiro amigo em comum havia dito ao Léo que passar pela fronteira exige passar pela fila de migração e que isso costuma exigir “certa espera”. Ok! Por “certa espera” Léo deve ter entendido algo em torno de umas 3h de antecedência. E aqui vai minha primeira dica para quem fazer esse percurso nessa época do ano: VC VAI PASSAR O DIA TODO NESSA FILA! Sério, olha essa foto! De ambos os lados: brasileiro e boliviano. Quase perdemos o trem, entramos sem carimbar a entrada, tivemos que pagar multa em Santa Cruz, alguns que estavam conosco foram abordados por policiais e tiveram que desembolsar ainda mais, enfim…

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Sobre o trem da morte vai minha segunda dica: SE VOCÊ FOR MESMO DE TREM, COMPRE A PASSAGEM PARA VIAJAR DE DIA. Quando sentei no trem e olhei pela janela o sol indo embora virei pro Léo e perguntei: “cara, viajar nesse trem é mais caro, mais demorado, mais desconfortável que ir de ônibus, e ainda a gente não vai ver paisagem nenhuma msm!???” Sério, foi uma das coisas mais estúpidas que fizemos nessa viagem! :/

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La Paz é alto! 3.660m para ser mais exato. O aeroporto fica em uma cidade vizinha que é 200m mais alta e se chama “El Alto” 😀  O que isso significa!? Para um cuiabano que mora a 176m do nível do mar significa sair do avião e parecer que tomou um soco no peito, respirar de boca aberta e andar como uma pessoa de 96 anos. Lá no fundo está os Andes! Lindo não!? S2

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A coisa que mais chama a atenção de turista e que você mais vai ver em La Paz são as Cholitas, ou Cholas Paseñas. São essas senhoras lindas que se vestem com essas vestes tradicionas dos tempos da colonização espanhola (esse chapeuzinho, saias longas e uma espécie de mochila feita de um pano amarrado nas extremidades, onde elas levam de tudo, inclusive seus bebês). No museu de folclore de La Paz descobrimos que as Cholitas e seus costumes são um patrimônio cultural do país. Rapidamente você vai perceber que elas não curtem muito serem fotografadas. Algumas até deixaram na boa, outras cobraram alguma grana, outras simplesmente não deixaram que tirássemos fotos. O Fred (Francês colonizador safado) quase apanhou,  várias vezes!

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Essa foto é só para dar a minha terceira dica: NÃO VÃO AO CHOLITAS WRESTLING! Cholitas Wrestling é um vale tudo de Cholitas que alguém teve a ideia de fazer para pegar turistas. Funciona! Só tinha turista nessa parada.. Por que não vale a pena!? Apesar da foto não é assim tão emocionante, e o pior: não vende cerveja! Meo, como você vai ver uma porradaria sem cerveja!?? Simplesmente não tem sentido.

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VÃO AO VALE DE LA LUNA! Um dos passeios mais massas que fizemos! Fica a uns 20km de La Paz, de taxi é baratinho (aliás, se tem uma coisa que é barato lá é taxi!), e possui uma formação rochosa única!

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Sobre La Paz: La Paz é Caótica!

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Tem teleférico da hora… Olha a Cholita escondendo o rosto!

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Tem gente vendendo de tudo na rua o tempo todo (isso são peças de carro!)…

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Tem festinha na rua…

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Com gente muito doida…

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Baladinhas com drinks estranhos (essa é a Tutuma, uma bebida à base de maracujá e especiarias)…

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E ladeiras… mtas ladeiras! Ah, quase esqueci.. Uma parada bacana para aguentar a altitude é tomar um comprimido chamado Soroche. Vende em qualquer farmácia. Quando vc entra em uma, aliás, o vendedor já vê sua cara  de turista e automaticamente já sabe o que vc quer. Outra estratégia, mais barata e comum é usar folhas de coca. O duro é aguentar 20 dias o gosto na boca, eu desisti depois de uma semana.

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Ao longo dos 20 dias de viagem passamos por 5 cidades. Uma das mais bacanas foi Copacabana, onde passamos o ano novo. Copacabana fica no lago Titicaca que é o lago de água doce natural mais alto do mundo (3900m de altitude). Além de ele fazer fronteira com o Peru, o Titicaca foi berço de pelo menos 3 das mais antigas civilizações ameríndias: os Tiahuanacos, os Aimarás (de onde descende o presidente Evo Morales) e posteriormente os Incas (que foi a galera que dominou outros povos, constituiu o maior império da América Pré-Colombiana e enfrentou os espanhóis quando aqui chegaram). A viagem de La Paz até Copacabana dura umas 2h30 e é preciso atravessar um braço do Titicaca. A embarcação leva muitos turistas e também nativos que moram nas ilhas do lago, como essa moça da foto.

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Em Copacabana existem muitos passeios para se fazer no lago Titicaca. Ilhas flutuantes, Ilha da Lua e Ilha do Sol, onde essa foto foi feita, são os mais comuns. Acho que essa ilha é a mais visitada. Você pode só dar um role pela parte sul da ilha ou pode fazer a parada mais hard que é ir de manhã para a parte Norte e caminhar 8km até a parte Sul pelo caminho Inca. Lembre-se de que você está a quase 4000m de altitude. Não é Bolinho não! E tem maluco que percorre tudo isso com um mochilão de 30kg nas costas para ficar acampado.

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A Ilha do sol preserva bem o modo de vida tradicional do povo Boliviano. Além do passeio histórico onde um guia muito gente fina te conta sobre a cidade submersa Tiahuanaco, os templos sagrados Incas, os modos de produção agrícola das comunidades e outras informações da hora, você vê pelo caminho os nativos pastoreando ovelhas pelas montanhas.. é mto bacana!

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Mais sobre Copacana: Domingo geral vai pra praia (é, é um lago, mas parece praia) e tem a cada 100m mesas de pinbolim (lá eles chamam isso de “Canchita” e jogam girando…tsc, tsc!)

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Tem pedalinho

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Pôr do sol maneiro (ta, não é igual o de Cuiabá..)

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A próxima cidade que visitamos foi Potosí, que é se não me engano a cidade mais alta da Bolívia (mais de 4000m). É uma das cidades mais antigas e tem um centro histórico bem típico das cidades coloniais com essas ruas estreitas ladeada por comércios diversos. Pegamos um pouco de chuva, mas foi um passeio muito bacana.

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Em Potosí, recomendo o banho de águas termais nas piscinas naturais no “OJO DEL INCA”. Você ta num frio danado, entra na piscina quentinha em um cenário de montanhas lindas. O difícil depois é sair da água..

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Outra coisa imperdível em Potosí é o passeio nas MINAS e vou falar um pouco mais sobre esse pico. Este na foto é Exaltacion, mineiro da cooperativa Kunti. A vida nas minas não é nada fácil, principalmente por conta do ar pesado e completamente insalubre. Passamos uma tarde nesse passeio andando pelas galerias e conversando com Exaltacion. A rotina dos mineiros é pesada e para aguentar o trampo só com muita folha de coca. Os mineiros passam o dia todo aliculando as folhas para ganharem disposição. Detalhe: Alicular é o processo de consumo tradicional da coca na Bolívia, consiste em não mascar a folha (como fazem os peruanos e outros andinos), mas deixá-la na bochecha para ser absorvida pela mucosa junto com um dilatador que pode ser bicarbonato de sódio ou cinzas de plantas (menta, banana e outras).

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Uma parada interessante sobre os mineiros é que apesar das condições precárias e do trabalho pesado eles tem a vantagem de trabalharem em um esquema cooperativo. As minas não pertencem à empresas ou ao governo. Reunidos em grupos pequenos, os mineiros possuem a posse da mina e tem liberdade de escolher os locais de exploração e a jornada de trabalho dividindo entre si o produto do trabalho coletivo. Segundo a guia local esse esquema permite que eles ganhem mais do que na época em que as minas pertenciam aos patrões que exigiam jornadas muito maiores e pagavam muito pouco aos trabalhadores. Na foto, Exaltacion segura um punhado de zinco recém extraído. Um saco de zinco bruto demora mais ou menos uma semana para ser extraído e vale 600 Bolivianos. Mais ou menos 300 reais.

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Outra parada muito interessante sobre as Minas é um altar com um demônio em uma das primeiras galerias. O demônio (ou “tio”, como eles se referem) nas minas bolivianas se tornou um elemento de fé e de proteção. Foi incorporado à crença indígena pelos espanhóis na tentativa de intimidarem e coagirem os nativos aos duros trabalhos nas minas. Acontece que o inferno cristão situado abaixo da terra é, segundo a crença indígena, morada da pachamama, a mãe terra, local de fertilidade e de devoção. O sincretismo religioso fez com que os indígenas não apenas não tivessem medo do demônio como o acolheram à sua cosmovisão como um elemento bom, já que vive no inframundo junto à pachamama. O tio fertiliza a pachamama e os dois dão os frutos da terra aos trabalhadores. O Diabo, então, é um cara massa a quem os mineiros prestam oferendas e homenagens! 😉

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Última da mina.. Sim, a gente pode explodir uma dinamite lá dentro! Essa foi uma das coisas mais inimagináveis e irresponsáveis que esse passeio oferece. Pensei que era uma bombinha a toa. Cara, senti meus órgão tremerem dentro do corpo.. foda!

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Salar Do Uyuni: Sem condições de perder essa. O Salar do Uyuni é o maior deserto de sal do mundo e é sal mesmo, a gente lambeu! Você pode fazer o passeio de 1, 2, 3, 4 ou até 5 dias. No passeio de 1 dia você conhece apenas o Salar, nos demais você vê outras paisagens muito, mas muito fodas! Fizemos o de 3 dias. É um passeio que chega até a fronteira com o Chile, no deserto do Atacama, passando por lagoas lindíssimas, formações rochosas surreais, Geisers, Águas Termais, Flamingos, Lhamas, Vicunhas (um animal parente da Lhama) etc. Ah, você faz todo o passeio nesses jeeps traçados. O passeio é comprado por agências no Uyuni (Uyuni é uma cidade, cheia de agências de turismo) e inclui todo o translado, alimentação e hotéis. Esse passeio de três dias custou 800 reais por pessoa, foi um dos locais mais em conta que achamos.

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Ilha Icahuasi: uma das primeiras paradas do passeio. Uma ilha de cactos gigantes no meio do deserto de sal. Sem palavras!

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Laguna Negra, Luzo e Léo.

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… S2

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Cidade de Pedra.

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Aqui a gente já está perto do deserto do Atacama, no Chile.

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Me disseram que as Lhamas cospem quando se sentem ameaçadas, por isso me escondi na moita. Ao fundo a Laguna Colorada, lugar dos lindos Flamingos.

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Não, isso não é marte. São as cores do pôr do Sol na Laguna Colorada.

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Não, isso não é o inferno. São os Geisers naturais que vemos no amanhecer do último dia de passeio. Oo

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Tá, são três dias de passeio. Temperatura de 5º com pequenas variações. Acho que eu e Léo fomos um dos poucos que tomamos banho nesses dias. Isso na foto são gringos tirando a nhaca no caminho de volta, no terceiro dia em uma deliciosa piscina termal.

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Para terminar nosso Rolê pelo Salar: Laguna Verde. 😉

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Tem mais foto, mais histórias, mais tudo. Ir para a Bolívia foi uma das melhores experiências que já tive. Tudo diferente, pessoas, paisagens, cheiros, cores, luz. Um destino que precisa ser conhecido por todo brasileiro! É realmente impressionante o quanto nossa visão desse país é deturpada pelo preconceito criado pelas imagens negativas divulgadas na nossa mídia. Além das paisagens belíssimas, fomos a museus incríveis, bebemos e comemos muito bem (Sinto até hoje saudades das trutas de Copacabana, da cerveja Potosina, do Api – uma bebida quente de milho, com pastéis, hum…) jogamos muita canchita (Ta certo que terminei com um score de 112×17 a favor do Léo :/) e conhecemos gente muito bacana. Fomos embora com muita vontade de voltar, e já sabemos até para onde: O roteiro de carnavais Bolivianos – Cochabamba, Oruru e Tarija. 😀 Até a próxima e espero que esse relato os animem a conhecerem ou a voltarem à Bolívia. Vlw galera!

*Luzo Reis é fotógrafo e supervisor do Cineclube Coxiponés da UFMT. 

3 Comentários

  1. Manerooo…Show de relatos. Caracas me senti na viagem cheio de NHACAS…hauahauahau…Bolívia eu AMO…Mas conheço apenas Puerto Suarez (divisa com Corumbá), San Mathias (divisa com Cáceres-Mato Grosso), Santa Cruz de la Sierra e Guayaramerin (divisa com Guajara-Mirin – Rondônia). Foram viagens com destino apenas nas cidades citadas – mas valeram a pena e muito.

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