Não consigo trabalhar e tudo se tornou gatilho para que a dor volte a me inundar. Eu sei que não sou só eu. Essa dor mental poderia ser a dor física de tantas pessoas, a dor física da fome, da violência, da doença que se alastra através dos perdigotos. Eu comecei esse caderno em 2016, e recorro a essas páginas no momento do transbordar, quando os sentimentos rompem as barreiras físicas e se confundem na realidade. Sinto em demasia. E agora, em 2020, vivemos uma crise sem precedentes.

O mundo conectado se viu obrigado a se recolher, parar e esperar. Esse momento em suspenso. Esse dia sem fim, que se alarga até engolir o horizonte. O que posso fazer, a não ser, me isolar? Assim como muitos outros, que do alto dos nossos privilégios, temos essa opção.

É tempo de pandemia. Coronavírus.

O problema de se isolar é ficar só com você mesmo. Pare para pensar: Qual foi realmente a última vez que você esteve só com seus pensamentos? Totalmente só? Entregue ao devaneio da mente? Relembrando tormentos? Tateando o escuro do desconhecido que habita em nós? Quem é você quando está só consigo mesmo? Talvez você se surpreenda ou se amedronte ao encarar fantasmas, monstros, verdades…

A verdade é que olhar para o abismo de dentro dói. Dá vertigem. A gente se depara com o vazio e cai. Basta um passo em falso e o tênue equilíbrio se esvai… A corda bamba da sanidade balança e derruba. Aí você se lembra da dor de todos os outros tombos, é essa profusão de feridas que se abrem e sangram.

É algo como isso o que sinto agora, e as forças lentamente deixando o meu corpo. Consegui confidenciar a duas amigas com as palavras exatas: não sinto vontade de viver. Não pensei em me matar, também não quero morrer, mas estou como que no limbo, flutuando entre os espaços daquilo que chamo vida. Todos os dias meus olhos apreensivos acompanham o relógio, mas parece que nada muda. O tempo imóvel. O movimento que cessou, a água que deixou de correr.

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Marianna Marimon, 30, escritora antes de ser jornalista, arrisco palavras, poemas, sentidos, busco histórias que não me pertencem para escrever aquilo que me toca, sem acreditar em deuses, persigo a utopia de amar acima de todas as dores. Formada em jornalismo (UFMT) e pós-graduação em Mídia, Informação e Cultura (USP).

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