Isabela Bonilha*
RELATO DE QUARENTENA
ISABELA BONILHA, 29 ANOS, PROFESSORA E DIRETORA ESCOLAR.
MORA EM GUIRATINGA, MATO GROSSO.
Gostaria de dizer, com as palavras mais bonitas, que esta quarentena aumentou e sensibilizou ainda mais meu coração de poeta. Que tenho olhado as coisas pequenas e me admirado com sua existência: a poeira se espalhando pelo chão liso e brilhante, o verde espalhado pelas plantas da casa que rego todos os dias, o barulho dos pássaros… Não seria uma total mentira, mas certamente seria meia verdade pois, apesar de observar e admirar tudo isso, meu coração torna-se a cada dia mais apático. Nenhuma palavra me ocorre. Meu ócio não é criativo. As poucas obrigações, às vezes, parecem fardos.
Falta-me o foco e, depois de ter passado da fase de negação, da de pirar com as notícias e da displicência (não sem dolo), chego àquela em que me questiono: que sou eu, mesmo? Esta criatura que arrasta chinelos e pés cascudos pela casa ou a que aparece na rede social? Quem é que o mundo vê agora? Às 15:40 da tarde, tomo uma cerveja quente e penso em colocar Raul pra tocar, pois “as perguntas continuam sempre as mesmas… quem eu sou? De onde venho? Onde vou dar?”. Acrescento mais algumas: quando isso acabará? E depois, como será?
*Isabela Bonilha - Formada em Letras Português e Literatura pela UFMT, professora, escreve desde os oito anos. Tem um blog que nutre desde os 13: Um Vagabundo e as Estrelas. Apaixonada por arte, gosta de pintar, costurar, customizar e alterar coisas ao redor, mas se encontra mesmo na escrita. Seu cenário é Guiratinga, na qual nasceu e foi criada.