Experimenta assim de Caio Mattoso foi um alumbramento para meus sentidos vivos olhos ouvidos tatos afetos surpresas dedos aqui e ali sem medos, ficou brilhante e Caio totalmente à vontade para fazer um show de verdade. Simples contemporâneo humano politizado poético (pré)tecnológico entre remixes e samplers de sons e imagens RxIxP  na medida exata do prazer. Uma dosagem arquitetônica-musical entre tônicas e disparates atonais ruídos plays backs maravilhas da vida de músico em 2018 que tem recursos de sobra nas mãos. Que ousadia e que primor de show.

Foto de Ahmad Jarrah

Caio é um poeta musical. Suas letras beiram o difícil terreno de uma habilidade sensitiva poética que chega a uma genialidade muito própria. Ou melhor, ele fura os conceitos pré fabricados das genialidades, é o mesmo que ouvir de nossas próprias bocas em coro com a poética oswaldiana: eira eira eira, o gênio é uma besteira, viva a rapaziada! A dura lida do artista coloca essa coisa toda no centro da questão. Como isso deve ser sustentado? Impossível não pensar nisso. Garanto que vamos voltar com essa pauta. Mas vamos falar do show: estive junto no processo de montagem e sou de ficar dando pitacos, acho até que Caio espera por isso mesmo. Mas a construção foi muito interessante, sei dos vários percalços para se chegar até ali no palco do teatro da UFMT, as crises dos envolvidos e tantas manhas e artimanhas que passam ao largo do público. O fã não quer saber, quer mais é ir lá e conferir um evento que satisfaça suas expectativas criadas e bombardeadas pelo incessante replicar, principalmente no Facebook. O público merece ser bem tratado e olha que tinha bastante gente, mais de dois terços do teatro, dava aquela sensação de um público decente e robusto, que cresce, e isso é muito bom. Como eu ia dizendo, o cara sai de casa se desloca passa fome e sede, vai ver um espetáculo e merece ver coisas boas. E como tem dado gosto participar mais da cena cultural em Cuiabá. Vai que vai muito bem no esteio de tantos bons trabalhos que dá um gosto de êxito na ponta da língua.

Anna Marimon/Foto de Ahmad Jarrah

Mas Experimenta assim tem um processo de montagem meio louca e coletiva, Caio é genial quando absorve tudo que ele provoca nos outros e usa sem dó, filtra e remixa tudo que interessa, um autêntico antropófago pós tudo, se é que você me entende, saca? A  gente dá os toques e desconfia que (ele aparenta) não estar nem aí. Mentira. Ele te surpreende. Usa tudo de bom tudo que cabe ali. Caio, Igor e Maycon combinam-se muito bem, rola uma química forte, são harmônicos. Os pré gravados de Igor Mariano, Sidnei Duarte e Alex Teixeira compõe uma base interessante num processo que vem de uma intenção de Caio Mattoso em utilizar músicos de alta qualidade. As composições do artista são marcantes, marcam uma época, legitimam uma geração de criativos dessa Cuiabá proto metropolitana. O show foi bem conduzido e teve participação especial de Anna Marimon com sua incrível habilidade em declamar poesia e interação bacana com os vídeos selecionados por Fabrício Chabô, Julianne de Quadros e João Batista (João Ninguém). Um espetáculo completamente envolvente.

Caio Mattoso/Foto de Ahmad Jarrah

Fazer uma análise musical passa por vários momentos da criação e da produção do conjunto da obra que pressupõe vários percursos, desde a concepção sonora até o espetáculo em sua totalidade, com luz, figurinos, objetos de cena, etc. É um processo em permanente construção que consiste em escavações da história da música, suas nuances e possibilidades, alta e baixa tecnologia, eletro acústico, boa dosagem cênica, o espetáculo é concebido despido de fórmulas disso ou daquilo, para se reinventar, são canções que Caio Mattoso vem experimentando em várias formações e roupagens há muito tempo. São variações em torno de um núcleo básico de produção poética, sua oralidade, cantoria, enfim, seu repertório autoral. São canções que ele vem cultivando há anos. A arte amadurece quando se trabalha com afinco, rigor estético e uma boa dose de paixão pelo que se faz.

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