Luiz Renato de Souza Pinto*
Em janeiro de 2015, quando fui a Recife para reencontrar depois de vinte anos meu velho amigo e poeta Carlos Barros, não tinha a dimensão exata de como Pernambuco ocuparia espaço em minha vida. E de maneira definitiva, tenho a certeza disso. Você, que me lê, pode perguntar de onde vem essa certeza toda. Pois digo: de uma manifestação mediúnica bastante primitiva, que é a intuição. A fruição das relações que vêm sendo estabelecidas desde então tem criado situações de comunicação que se aperfeiçoam com o passar do tempo, ganham novos contornos, abrem-se novas fronteiras.
A publicação de Duplo Sentido, em 2016, com recursos do Fundo Municipal de Cultura de Cuiabá, parceria de crônicas/contos com o recifense, foi o primeiro passo. Carlos Barros veio a Cuiabá para o lançamento; durante dez dias conviveu com minha realidade, realizou palestras no Instituto Federal de Mato Grosso, campus Octaíde Jorge da Silva, em que trabalho, contribuiu para a formação de meus bolsistas no projeto que adapta o livro Em meu seio, há liberdade, da professora da Universidade Estadual de Pernambuco (UPE), Rossana Ramos e deixou saudades pela maneira singela com que conduz a própria vida.
Em Ouricuri visitarei a instituição irmã, o campus do IF Sertão. O caminho da literatura é árduo e a tarefa que se me impõe, de formar leitores é a pedra de toque da viagem, misto de pesquisa empírica e assanhamento de quem sonha em morar nesse Nordeste Maiúsculo, como todo e qualquer cabra da peste. Quem sabe, encontrar uma Maria Bonita para sossegar meu facho, para manter acesa a chama desse lampião a gás. Tenho um pedacinho de sertão em minha casa. Livros de Patativa, de Chico Pedrosa, música de Mariano Carvalho, de João Emídio, cordéis de Junior Baladeira. Chapéu de cangaceiro, comprado em Serra Talhada, muitos imãs de geladeira, camisetas de várias cidades. E algumas miudezas que ressignifico a cada viagem, a cada novo olhar.
Mas o imaterial não tem valor comercial. Não se calcula friamente. O cumprimento nordestino, a simpatia, a maneira de encarar a vida, de superar obstáculos traz para o plano da humanidade um diferencial. Cabe em mim um respeito crescente pela cultura sertaneja. E é com esse respeito que vivo e almejo lançar sementes nesse solo abençoado. De pouca água, mas muita luz.
Minha paixão segue intensa. Sempre que posso pego um voo para algum ponto em que esteja de frente a esse mundo diferenciado da cultura brasileira. Nada como um cuscuz, bem cedo, ao café da manhã; com ou sem macaxeira, um café bem quente, um pão com queijo de coalho. A música de Lenine me embala, ou Chico Cesar, ou de outras figuras lendárias desse rincão. Ouço a poesia de Jessier Quirino e fico me sentindo um parafuso do cabo de serrote.
Tenho assistido a vídeos de Flávio Leandro, relembrando a poesia de Mano Melo. Recentemente recebi notícias de Miró, pela Luna Vitrolina, agora nos próximos dias reencontrarei ao David Henrique, de Belo Jardim. Estará conosco em Ouricuri em setembro. Meu álbum de figurinhas já está bastante desfalcado. Samaral, Paulo Cac, Zeca, agora o Eud Pestana. A vida não dá um tempo ao tempo. O lugar de amar é o aqui e agora. Até para que haja o depois.
*Luiz Renato de Souza Pinto é cronista viajante, poeta, professor e ator
“Maria Bonita, musa de qualquer cordel, estenda sua corda, seu varal, para que o poeta se dependure em cordéis, como fossem as madeixas que descem do balcão. Que os obstáculos sejam postos abaixo a fim de que o grande encontro se realize para além dos palcos da vida. Para que qualquer picadeiro seja o espaço em que o espetáculo se revigora. A vida não espera, não deixa para depois. Salta de mais um verso, da ribalta de rimas altas e métrica bem definida, um novo curso para a minha vida. Olho para a frente e penso em tudo o que há para depois daquela curva. E sigo na certeza de que gostarei do que vou encontrar.” Barbaridade mano veio que coisa linda esse trecho da sua cronica…o Paraná é em Pernambuco com certeza, tu já é de lá…