Por Kaio Henrique e Kálita Skilof*

As histórias que iremos dividir com vocês mostram que na área da fotografia existem muitos preconceitos, principalmente quando as pessoas a enxergam como um hobby, um passatempo de quem não tem o que fazer, e não um trabalho. Trata-se de uma profissão que, como qualquer outra, exige bastante esforço, habilidade e responsabilidade, principalmente para os mais jovens. Na maioria dos casos, os profissionais são apaixonados pelo que fazem e, como em tudo na vida, se é feito com amor, é bem realizado.

A profissão do fotógrafo, apesar de ser uma arte, possui inúmeros obstáculos. Além de acordar cedo para organizar equipamentos, quem trabalha na área precisa se adaptar a lugares, pessoas e ocasiões diferentes. Organização e tato social são alguns dos maiores desafios, uma vez que a rotina é corrida e os clientes nem sempre simpáticos.

Outra questão presente na vida dos fotógrafos é a falta de segurança, pois utilizam vários equipamentos de alto custo para realizar os ensaios. São câmeras, lentes, tripés e similares que facilmente ultrapassam a casa dos milhares de reais. E como eles sempre estão de um lado para o outro e algumas vezes não conhecem o próximo freguês, é realmente ‘uma profissão de risco’.

 Quebrando a cara é que a gente aprende

 

Autorretrato de Marcos Dourado. Para ele, fotografia é uma junção de realidades

Marcos Vinicius Dourado, 18 anos, da cidade de Mineiros (GO), conta que o interesse pela fotografia ocorreu a partir de um ensaio que fez com uma prima. Na época, em 2010, não tinha ideia do que era ser fotógrafo. Montou uma espécie de estúdio ali mesmo, na sua casa, com vários lençóis do armário. Ao fazer os cliques percebeu o quanto gostava daquilo, tudo na fotografia era mágico, a produção, as fotos, poses, figurino. Então começou a fazer disso uma rotina… Colocava as primas e amigas como modelos e realizava os ensaios. Assim foi percebendo que a fotografia era o que queria para a vida.

No começo, como muitos iniciantes e pessoas que não têm contato com o meio, achava que bastava fazer as fotos e entregá-las. Quando passou a conhecer melhor a profissão, ele descobriu que ser fotógrafo ia além de apertar um botão. “Hoje em dia fotografia para mim é saber direcionar seu foco, ter atitude para desenvolver o ensaio, ter um olhar diferente e crítico, saber fazer uma produção. A fotografia é mais que o ensaio fotográfico, é uma junção de várias realidades. Não é simples de se lidar, mas quando você pega a rotina, vai se adaptando e se acostumando”.

O rapaz pensou inúmeras vezes em desistir da profissão, só que em toda ocasião que cogitava a ideia, percebia que a área da fotografia era seu lugar e que não conseguiria trabalhar em outro ambiente que não fosse aquele. “Na vida a gente tem momentos altos e baixos. Havia algumas críticas que me deixavam triste. Havia momentos em que eu estava cansado e queria desistir, mas a satisfação de clicar e fazer aqueles ensaios eram bem maiores e não me deixavam desmotivar. A fotografia é o lugar em que eu me encaixo. Eu não me vejo seguindo outra profissão”.

Marcos Dourado é um fotógrafo de renome em Goiás na produção de ensaios, elogiado por seus clientes e profissionais da área. Atua em Goiânia e também faz trabalhos em Alto Araguaia (MT) e em Mineiros. O menino que começou com o estúdio de lençóis na própria casa, treinando com primas e amigas, que pensou em desistir por conta dos preconceitos sofridos, possui hoje quase 20 mil seguidores em sua conta no Instagram e se mantém com o dinheiro da profissão de fotógrafo (https://www.instagram.com/eumarcosdourado/).

 

Ensaio para a Coleção Anna Prata África. (Marcos Dourado)

“Uma coisa que eu sempre falo pra quem vai começar… pode parecer clichê, mas é a mais pura verdade, é que é quebrando a cara que a gente aprende. Se tiver oportunidade, você deve ir. Você nunca deve desistir. Se for preciso, faça e refaça um trabalho. Estude que também é muito importante. Eu nunca fiz curso, mas sempre busquei referências. Quando você está começando o melhor a fazer é se esforçar ao máximo. Gente para opinar vai existir em qualquer profissão, então ignore e faça o que realmente ama”. É a mensagem que ele deixa como forma de motivar os companheiros e simpatizantes da área. 

O primeiro contato

Marcos Augusto Santos Silva, 23 anos, nascido na cidade do Rio de Janeiro (RJ) e estudante de Jornalismo da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat)/campus de Alto Araguaia, interessou-se pela profissão em 2013. Ele conta que estava trabalhando e logo percebeu que havia uma manifestação de rua próxima ao local, no Rio. Correu até o lugar e viu fotógrafos em busca do melhor ângulo, da melhor fotografia “em meio àquela confusão toda”.

“Foi uma enorme adrenalina, um sentimento que eu não consegui explicar”. A partir de então, decidiu fotografar e hoje é apaixonado pela profissão. Ele busca associar a fotografia ao fotojornalismo. Faz incursões pelo lixão de Alto Araguaia e por manifestações de movimentos sociais. Confira trabalho de iniciação científica feito pelo universitário aqui.

Algo corriqueiro na profissão, Marcos Augusto também sofreu preconceito. E segundo ele, foram várias vezes. Uma delas em Alto Araguaia, durante um evento, que prefere não mencionar o nome. Ele afirma que foi retirado do palco “por não estar apto para a profissão”. A cidade tem uma pequena população (17,8 mil habitantes, conforme estimativa de 2016 do IBGE) e dar publicidade a uma crítica pode reduzir o campo de atuação.

“Essa não foi a primeira vez. Em um outro evento fizeram a mesma coisa. Disseram que eu não tinha um equipamento grandioso e muito menos experiência para estar ali. Mesmo eu tentando explicar que estava contratado para fotografar o evento, eles me tiraram, falando que meu lugar não era ali, que nem formação eu tinha”, comenta o rapaz.

Os fotógrafos em início de carreira, geralmente, sofrem mais preconceito. São discriminados por parte dos que se dizem experientes, sob a alegação de que “não têm olhar” e nem domínio sobre a fotografia.

Adriana Porto em aula de campo durante curso de fotografia em São Paulo (SP) (Foto: Bárbara Malvar)

A história de Adriana Porto Moraes, 22 anos, tem semelhanças com a dos dois Marcos: começou cedo e também enfrentou as dificuldades do meio. Ela é de Alto Araguaia e estuda Jornalismo na Unemat. Adriana conta que seu primeiro contato com a fotografia foi ainda criança. Lembra que com uma ‘câmera de filme’ fazia as amigas de modelo para realizar seus ensaios e também registrava imagens para as pessoas que trabalhavam na fazenda do pai.

“Eu ainda era criança e fazia fotos para o pessoal que morava lá. Eles não tinham muitos recursos, eram raras as vezes que vinham para a cidade, então eu batia as fotos com uma câmera cyber-shot. Na época eu cobrava R$ 0,50. Sempre ia bem animada com as fotos para revelar, porém o rapaz (do laboratório) colocava inúmeros defeitos”, detalha. Ele dizia: “Nossa! Essa foto aqui ficou muito ruim! Nossa! Olha isso!”.

Situação desmotivadora, uma vez que ela era apenas uma criança e sentia muita vergonha com as críticas do profissional. “Eu fazia aquilo pra ajudar as pessoas e era ‘carimbada’. É importante você motivar as pessoas que estão começando e não ficar ofendendo. Isso desmotiva muito, ainda mais pra uma pessoa que está iniciando ou pra uma criança, que era meu caso”.

Ao longo dos anos Adriana se distanciou da fotografia. Estava a procura de coisas novas, rumos diferentes. Agora, de uns três, quatros anos para cá, voltou a se interessar. Foi então que comprou uma câmera semiprofissional, buscou fazer curso na área e se dedicar mais à fotografia, para então se especializar.

Personalidade forte

Karol Benicio na cobertura da “Prisma Trance” em Rio Verde (GO). (Priscila Assis)

Há quatro anos na profissão, paulista e estudante de Jornalismo na Unemat/Alto Araguaia, Karoline Benicio Gonçalves, 20 anos, destaca que a vida agitada de São Paulo a fez participar de vários encontros fotográficos, o que a permitiu conhecer pessoas do meio e as particularidades da profissão. Os eventos funcionavam da seguinte forma: um grupo de meninas se dispunha a posar para as fotos enquanto fotógrafos profissionais e amadores realizavam os ensaios. Era um trabalho colaborativo que também envolvia maquiadores e figurinistas.

Karol, como é mais conhecida, conta que nesses encontros ela e outros fotógrafos iniciantes sofriam bastante preconceito. Os jovens que buscavam experiência e aprendizado deparavam com um tratamento pouco amistoso dos profissionais com mais tempo de estrada e a falta de disposição deles em ensinar. “Eles pegavam as melhores modelos e iam para lugares isolados, agiam com ar de superioridade em relação a quem estava começando”, lembra. Sem contar o fato de que já tentaram lhe proibir de trabalhar, alegando que não era profissional.

No entanto, a personalidade forte passou a caracterizar a atuação de Karol no meio. Ela faz da fotografia também uma forma de denúncia social e defesa dos direitos humanos. Karol integra um coletivo afro na universidade e é engajada na causa feminista. 

Quebrando Preconceitos

Destruindo frases que fotógrafos têm que ouvir no dia a dia

“Nossa, que caro! É só apertar um botão.”

Meu amigo, só apertar um botão é fácil, imagina regular a câmera. – Marcos Dourado

“Não faz de graça pra mim?”

Olha, meu equipamento tem um custo, meu curso tem um custo e meu tempo tem um custo, então eu não posso fazer de graça. – Adriana Moraes

“Sua câmera é muito boa!”

Claro que o equipamento conta com o material que está produzindo, mas o resultado final vai além de uma câmera boa, tem toda uma configuração, posição, um olhar ali atrás dela pra que você veja a foto pronta. – Karoline Benicio

“Com uma câmera dessas, até eu…”

Quando eu escuto isso eu entrego a câmera pra pessoa e falo: “Certo, agora faça uma boa foto”. Geralmente a pessoa fica travada, ela nem consegue disparar a imagem. Aí eu falo: “Não é só a câmera. Você precisa ter um conhecimento atrás da câmera”. – Adriana Moraes

*Kaio Henrique e Kálita Skilof são estudantes do 7º semestre de Jornalismo 
da Unemat/Alto Araguaia

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