Ivy Menon
A mãe mandou Ester e Laurinha atrás do pai, no bar. Passara da hora da janta. Temia que ele estivesse sem-vergonhando: “tantas rameiras dispostas a tirar o dinheiro do sustento das crianças”, dizia. Tremia, de antemão, por saber dos gritos, caso ele chegasse bêbado. Nunca tivera coragem de enfrentá-lo. Era miúda. Enlouquecida de dependência do marido. Não poderia buscá-lo, na rua.
Pelas filhas, não haveria de se enfurecer, pensou, a outra menina. A mãe. E se deitou a passar roupas. A eternidade cabe em quinze minutos. Nada sabia de Einstein e sua teoria da relatividade. Conhecia o peso da angústia de arrastar a espera. E a loucura de não caber, em si, tantos filhos. Nem sina. A mesa da cozinha aguardava pelo pai. O prato-feito tampado esfriava.
Ele voltou por outro caminho. O rosto vermelho de cachaça e sinuca. De bico. Bolsos vazios, pronto para a briga. Esperava que a mulher lhe esquentasse a comida. E lhe desse prazer antes de dormir.
Desencontros geram tempestades, quando, no céu, há nuvem do tamanho da mão de um homem. A mãe jurou não saber das filhas. Elas chegaram sem notícias. Um arrepio lhes percorreu as espinhas. A mãe saiu de perto para ver se os menores dormiam. O pai nada disse. Havia fogo em seus olhos insanos e a cinta dobrada em uma das mãos.
Ivy Menon, 62 anos, natural de Cornélio Procópio-Pr, escreve poesia, crônicas e contos, os quais publica nas redes sociais e e revistas eletrônicas. É bacharel em Direito, com pós em Filosofia, além de jornalista e teóloga. Gosta, de verdade, de ser vovó! Aposentada, mora em Rio Negro-Pr. Uma das finalistas (Poesia) no Prêmio Off Flip em 2018 e 2019