Por Reinaldo Marchesi*

“Uma mentira repetida milhares de vezes vira uma verdade”

(Joseph Goebbels – O chefe da propaganda nazista)

Na época da Inquisição, ou dos regimes totalitaristas, destruir e queimar “livros indesejados” era prática comum para manter a população na ignorância, privando-a do acesso ao conhecimento escrito. Nos dias de hoje, numa época caracterizada pela super abundância de informações – com a falta de tempo e disposição das pessoas para avaliar a credibilidade das fontes – tem se tornado cada vez mais eficiente aos “especialistas em informação distorcida” usarem o recurso da repetição de mentiras para manipular a opinião pública, aproveitando-se da “cognição preguiçosa” de pessoas que tendem a ignorar fatos, dados e eventos que obriguem o cérebro a um esforço adicional.

Cena do clássico do cinema "Fahrenheit 451" em que a profissão de bombeiro só serve para queimar livros, em uma sociedade futurista que só consome televisão.
Cena do clássico do cinema “Fahrenheit 451” em que a profissão de bombeiro só serve para queimar livros, em uma sociedade futurista que só consome televisão.

Vale lembrar que, no ano de 2003, os Estados Unidos invadiu o Iraque fundamentado na mentira que disseminou por meio de agências que noticiaram que ali havia “armas de destruição em massa”. Há tempos que os norte-americanos nos ensinam que meias verdades mescladas com mentiras dão bons resultados nos noticiários. Agora em 2016, os “fact-checkers” (uma espécie de comprovadores de fatos) do site Político elaboraram uma estatística ao longo de uma semana: Donald Trump mentia a cada 3 minutos, Hillary Clinton a cada 12. Não diferente dos processos anteriores, as acusações sem provas fizeram parte deste episódio eleitoral marcado por embustes, meias verdades e notícias falsas.

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Por meio de informações geradas pelas novas tecnologias de informação e comunicação (TICs), são criadas centenas ou milhares de versões para o mesmo fato. Segundo o dicionário Oxford, a Pós-verdade, é um “adjetivo que diz respeito a circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos importância do que crenças pessoais”. Cientes disso, os Spin doctors (especialistas em informação distorcida) entram em cena produzindo seus factóides e através da notícia falsa conseguiram criar a doutrina do medo social como forma de domesticar a população. Fatos fora de contexto, estatísticas distorcidas e notícias inverídicas são divulgadas amiúde por personalidades públicas e pelos órgãos oficiais de imprensa.

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No Brasil, o presidente golpista Michel Temer não é o primeiro político a usar da desinformação para manipular a opinião pública, antes dele os ditadores militares também o fizeram com maestria: mentiras propagandeadas e repetidas para “justificar” a urgência por medidas radicais de um governo não democrático e ilegítimo.

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A exemplo, na área da educação, mentiras vêm sendo divulgadas amiúde pelo então governo golpista, com objetivo claro de atender interesses escusos. Os resultados do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foram calculados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (Inep), realizados de acordo com a portaria n° 501, de 27 de setembro de 2016. Contudo, por meio de um interpretação “errônea” da legislação, os dados foram manipulados para divulgação dos resultados do Enem 2015 por escola, de modo que: excluíram da lista 96% dos Institutos Federais de Ensino e negativaram a Educação Pública como de má qualidade. Nos dados noticiados em primeiro momento, descaradamente o Ministério da Educação do governo golpista divulgou apenas 12 campi, omitindo os demais de um total de 275, ou seja, apenas 4% do total de institutos federais constaram nos resultados. Após publicação mentirosa e sua ampla divulgação, o INEP retratou-se e disse que a exclusão não passou de um “mero equívoco” e que os dados seriam incluídos em nova lista. Todavia, nós que não temos “cognição preguiçosa” sabemos que o “mero equívoco” foi proposital para esconder 237 Institutos Federais de Ensino que obtiveram notas acima da média nacional.

Os resultados do último PISA, dias atrás, revelaram que a educação piorou nos últimos anos no Brasil, sobremaneira em leitura e matemática. Neste cenário, embora não seja dos bons, muitos balbuciaram críticas apenas à escola pública, contudo, quem não teve “cognição preguiçosa”, foi lá e conferiu: os estudantes federais obtiveram o desempenho Coreano em Ciências. Todavia, os asseclas do capital preferem interpretações genéricas e falsas para sustentar o processo de dominação à serviço do pensamento privatista.

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Afinal, a quem serve a crítica e depreciação indiscriminada da imagem da educação pública no Brasil? A grande manobra de propaganda negativa é financiada por empresários e grandes grupos do setor educacional. Fiquemos atentos as Fundações que costumam se colocar como apartidárias, porém, nos bastidores do poder legislativo comportam-se elas mesmas como partidos.

Em artigo publicado mês passado, “Conheça os bilionários convidados para ‘reformar’ a educação brasileira de acordo com sua ideologia”, Helena Borges pontua que “os interesses que ficam por de trás destes ‘partidos’ nem sempre são facilmente notáveis: o honesto desejo por um mundo melhor, a lavagem de consciência, o tráfico de influência, e até a lavagem de dinheiro. Além das óbvias isenções fiscais e imunidades tributárias cedidas às fundações por suas benesses, há um ponto a mais quando se fala de ligação entre fundações educacionais e grandes empresas: a formação de funcionários.

Os 24 parlamentares (12 senadores e 12 deputados federais) integrantes da Comissão Mista (Medida Provisória – MP n°746/2016), convidaram um total de 57 pessoas à participar das audiências públicas na Comissão Especial para Reforma do Ensino Médio. Fato curioso é que apenas 2 alunos e 9 professores foram convidados à integrar o grupo, ao passo que os demais lugares foram reservados às fundações e institutos empresariais.

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O “novo ensino médio”, é fruto dos anseios de um amplo debate do Instituto Inspirare, Fundação Lemann e Instituto Unibanco. Foram chamados à mesa: representantes da fundação do homem mais rico do Brasil, o “rei da cerveja”, Jorge Paulo Lemann, da Escola Eleva; funcionários do bilionário contado entre os dez mais ricos do país, Ricardo Henriques, superintendente-executivo do Instituto Unibanco, cujo principal projeto é o Jovem de Futuro; Ana Inouse, consultora da educação da Fundação Itaú; Anna Penido, diretora executiva do Instituto Inspirare; Priscila Fonseca da Cruz, presidente executiva do Todos pela Educação; David Saad, diretor-presidente do Instituto Natura; Marcos Magalhães, presidente do Instituto de Co-Responsábilidade pela Educação (ICE); entre outros.

Se porventura no ensino médio e técnico forem ministrados alguns treinamentos aos futuros empregados desses grandes grupos, alguns mega-empresários não precisarão gastar tanto com recursos humanos. Por exemplo, considerando que a média brasileira de gastos com treinamentos é de algo em torno de R$ 500 por funcionário, uma empresa com mais de 40 mil empregados como a Ambev, de Jorge Paulo Lemann, significaria uma economia de R$ 20 milhões ao ano, apenas para uma única empresa da lista das grandes.

A nossa única esperança para mudarmos este quadro que foi arquitetado de cima para baixo, é a luta de baixo para cima. Mobilização, protestos e mais protestos! Continuar a ocupação das escolas, das universidades e das ruas contra as malditas reformas deste governo golpista e ilegítimo.

*Reinaldo Marchesi, professor, mestre em educação

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