Um cisco no olho. Um incômodo.
Ruído.
Dê-se o nome que quiser, use a expressão que preferir. Todas, de algum modo, serão capazes de traduzir o estranho Mundo Animal de Gervane de Paula: exposição de artes visuais que você pode conferir na Galeria Arto, em Cuiabá.
Gervane já é nosso velho conhecido, sempre guerreiro da causa da arte, militante da cultura, artista de mão cheia, cabeça cheia, politizado, crítico, sem papas na língua. Sua arte extrapolou os limites dos suportes, não há mais limites no uso de materiais, superou tintas, telas e pincéis, hoje usa de tudo, concreto, madeira, tecidos, plásticos diversos, flores, papéis, cera, pregos, placas de ruas, de estradas, recolhe materiais por onde passa, sua vida é puro trabalho, produz muito, em excesso, cruzes, chifres, livros fakes. O ambiente é perturbador, Gervane desde sempre foi um provocador.
Não quero ficar falando de teorias ou regras analíticas, das linguagens frias e mortas das academias ou das teorias críticas. Quero provocar Gervane, que roça o brega, o kitsch, bebe de todas as fontes populares, parece um jornal com milhares de notícias a invadir nossos olhos, agride, suaviza, faz rir, humoriza, tira onda, satiriza, sacaneia, deita rola e ri na cara dos bextas.
Mas só roça o kitsch, pois tem uma sabedoria que só resvala no aparentemente fácil. Não é tão simples sacar sua sofisticação no trato com a linguagem popular, não se iludam, ele só parece fácil, pois cria incômodos, bota cisco no olho da gente, provoca calafrios de horror ao escancarar as cores do roubo. Laranja, preto e branco, pergunto a ele, não teria o roubo todas as cores? Mundo do cão: Nilson Pimenta no cu deles. Barbariza. Joga na cara: arte aqui eu mato.
Ele gosta do que faz, não saberia não fazer isso, seria a morte.
Cruzes, vejo cruzes em você! O artista carrega o peso da cruz, ele é o primeiro a sofrer carregando sua cruz, convida outros a carregarem, quem se sujeita? São + de 100 cruzes, de Jonas Barros, Clóvis Irigarai, Basquiat, e tantos outros. São mais de 50 cruzes de convidados, compradas, adquiridas em exposições, ou achadas, recriadas, criadas, mal criadas, não há limites para esse cara, que no meu olhar, é dos nossos homens gigantes. Menino bom, menino (ani)mau.