A ardência nos olhos ao ver o sofrimento dos animais e das matas, com enormes áreas completamente destruídas já não conseguimos visualizar os alagados e o verde da vegetação mista. Os efeitos da devastação dos incêndios no Pantanal serão sentidos por anos a fio.
A verdade é que não há como saber o tamanho do impacto na biodiversidade de animais e plantas que habitam a região. Na última semana, uma tempestade de areia e fuligem tomou conta dos céus, demonstrando que o pior ainda não passou. O Pantanal continua a arder, as terras continuam a queimar, e pouco se fez para estancar essa catástrofe ambiental.


Seguimos sem rumo, inertes, como se o fogo não nos afetasse a todos. Mas, tudo está inteiramente conectado nessa teia intrincada de acontecimentos. O que arde hoje, consome mais um pouco do amanhã. Dessas cinzas, não sobra mais vida.
Em entrevista ao Cidadão Cultura, o fotógrafo Lucas Ninno relata o cenário desolador que encontrou na região do Pantanal. Suas fotografias chegam como um alerta de que o perigo não passou. Estamos tateando em busca de respostas das quais já cansamos de fazer as perguntas. Precisamos romper o silêncio e dar nome ao que nos corrói por dentro e por fora.


– O que você documentou ao chegar no Pantanal? Qual foi o cenário encontrado?
Chegando lá, o que mais me assustou foi a seca. Era impressionante a falta de água total. Para além das partes queimadas, os córregos que costumam ter um pouco de água mesmo durante a seca, estavam completamente vazios. Alguns com uma ou outra poça de lama, mas eu já fui no Pantanal várias outras vezes, inclusive durante a seca, e nunca tinha visto isso. Essa parte do clima me chocou muito.


E do meio da Transpantaneira pra frente tem muitas áreas queimadas, uma boa parte. Eu fui num pedaço do rio que durante a cheia é uma parte já muito conhecida por fotos, porque é super bonita, porque as plantas aquáticas cobrem a água e o rio faz uma curva bem única. E tudo isso virou terra, não tem nada de água, nada. E a própria devastação do fogo mesmo: os focos de incêndio que dava para ver da estrada mesmo, as colunas de fumaça se formando… um cenário apocalíptico mesmo.
– Em suas andanças e registros, qual foi a sua percepção da população local? Como estão e como se mobilizam?
A população local estava em choque, triste, abalada. As pessoas que moram no Pantanal há muito tempo estavam assustadas com tudo que aconteceu. E todo mundo fala que nunca tinha visto uma coisa dessas ali, que não tem nenhuma lembrança tanto de uma seca tão intensa quanto de uma queimada tão severa.


Mas a mobilização é bem variada. Tem gente local, os trabalhadores das fazendas ajudando, mas tem muita gente de fora, pessoas que se voluntariaram: profissionais, veterinários, funcionários de ONGs. Então se formou uma boa força-tarefa, principalmente de voluntários.


– Você acompanhou alguma ação governamental? Como está a atuação dos governos no combate ao fogo do Pantanal?
Eu acompanhei dentro da chamada Baía das Pedras, que tem uma pista de pouso, e é onde estava o comando da operação. Acompanhei um pouco da movimentação ali por vários dias. Ali tem alguns aviões de combate, do ICMBio, Corpo de Bombeiros. Tinham militares da marinha e eu vi operando dois helicópteros. De ação governamental eu acompanhei um combate dos bombeiros à noite, lá na Transpantaneira, mas era muito claro de que o efetivo empregado era muito pouco para o tamanho do Pantanal. Era uma operação que com certeza precisava de mais gente e mais recurso do que foi empregado, tanto é que agora é que estão chegando mais homens para o combate, e agora é que está começando a chover. Existiu ação governamental, mas ao meu ver, foi insuficiente.


– Há possibilidade de recuperar o bioma depois dessa devastação toda?
Ouvi de vários pesquisadores que pode ser que a natureza encontre uma maneira de se recuperar, porque invariavelmente a natureza segue um curso. Mas o prejuízo é enorme e isso vai demorar bastante até acontecer. Tem cientistas já fazendo pesquisa e contabilizando os prejuízos para justamente traçar os possíveis caminhos a ser percorridos para a recuperação do bioma. A possibilidade existe com certeza, mas é um processo que vai demorar muito. O receio que me dá é que nos próximos anos esses incêndios sigam acontecendo, porque se a gente teve esse incêndio tão severo nesse ano, a gente não pode ter outro de novo, senão vai ficar cada vez mais difícil de se recuperar o bioma.


Colaboração: Alessandra Marimon e Carol Marimon.