O mundo mais uma vez se estarreceu com o reality show conduzido por Donald Trump no exercício do mais alto cargo de poder do mundo: presidente dos Estados Unidos. Seu jogo é o mesmo. Faz mistério, permanece em uma posição ambígua, despista e mantém o interesse em seu próximo movimento baseado em sua própria inconstância. É tudo pela audiência, pelo suspense, o enredo. Todo reality show é um pouco forçado, aquela dúvida constante de será que é mesmo real ou não passa de uma encenação? Uma encenação galgada na realidade. Depois de segurar o suspense, o clímax, o golpe, a ação. Donald Trump anuncia a saída do segundo maior poluidor do planeta do Acordo de Paris. O mundo acompanha de queixos abertos, e a sensação de incerteza paira no ar: Ele teve coragem de fazer.

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O presidente dos Estados Unidos seguiu fiel o próprio enredo. Nós é que nos surpreendemos mesmo cientes de seu posicionamento, de que cumpre as promessas eleitorais feitas aos homens brancos da classe média que se sentem menosprezados e excluídos do sistema capitalista, sem chances de vencer aqueles que consideram inferiores. As declarações de Trump sempre desconsideraram o aquecimento global. Ele não acredita na ação humana no meio ambiente. Ele não acredita em sua responsabilidade no mundo que nos abriga. Ele não acredita na única casa que existe para todos nós. Em seu reality show ele não disfarça quem é, seu radicalismo é o que garante o ibope, a continuidade do enredo. Ele sabe disso, sabe como funciona o show business, como criar ilusões e vendê-las como drogas. Como criar enredo para embaçar a realidade. E abusa dos recursos pirotécnicos.

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Mas assim como Donald Trump existem milhões de pessoas, talvez até bilhões. Pessoas que não acreditam no efeito da ação humana. Pessoas que acreditam que o enredo ao chegar em seu ponto culminante seja ação sem ser ação. Como se não fossem responsáveis pelo que pensam, produzem, consomem, defecam. Assim Trump representa a pós-verdade no mundo moderno. Um enredo alternativo que escolhe interpretar a realidade ao invés de aceitá-la como é, que cria a própria história, que considera opinião como fatos. Mas, repito, esta onda fundamentalista que cresce na crista das fake news revela este tipo de pensamento. Não é só nos Estados Unidos, isso é algo que está acontecendo em todos os lugares.

Os recursos naturais são finitos. Tudo tem um fim. Apesar da Terra continuar no mesmo lugar e espécies nascerem, morrerem e se extinguirem, os humanos em sua vaidade e soberba acreditam estar acima de tudo, de toda as outras vidas. Seguimos sintonizados neste reality show que produz ilusões e as vendem enquanto matam, dilaceram, desmatam, dizimam. Tudo para manter o ibope e os eletrônicos ligados.

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Os rios estão envenenados com a nossa merda. Os oceanos abarrotados com os nossos lixos. Matamos as matas para produzir a carne macia do churrasco, a soja para alimentar nossos corpos e porcos, o agrotóxico para livrar das pragas e envenenar o leite das mães. Mas o aquecimento global não existe, eles afirmam sem levantar uma ruga de hesitação. Sério? E todos os gases poluentes? Toda a geração de energia que abastece nosso mundo enquanto o drena? Não é uma questão de escolha. Não podemos escolher se o aquecimento global existe ou não. É real.

Este é mais um retrocesso para o mundo, para a vida dos humanos na Terra. É mais um passo que damos rumo ao fim. O Brasil e Mato Grosso que participam do Acordo de Paris, que se comprometem em preservar o meio ambiente, não emitir gases poluentes, não desmatar, reflorestar e etc, nada faz para barrar o avanço mortal sobre as nossas florestas, rios, recursos naturais. O pensamento é de extrair, extrair, extrair e lucrar, lucrar, lucrar. Nada mudou. Continuamos colonizados pelas grandes potências. A saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris é simbólica. Na prática o modelo predatório das riquezas naturais continua e aumenta. Perde força a conscientização ambiental em nível de mundo quando a maior potência mundial tem como presidente uma pessoa que refuta a ciência, que escolhe aquecer a sua economia com um discurso que destoa da realidade e inflama os setores radicais que o apoiam. O preço? O futuro.

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Enquanto acompanhamos o caos político do Brasil, por exemplo, a bancada ruralista avança nas votações do Congresso Nacional, os temas que são de interesse como diminuir as áreas de proteção ambiental da Amazônia, transferir para o próprio poder a decisão de demarcar as terras indígenas (no caso não demarcar).

Na esfera de Mato Grosso vemos a tentativa de acabar com o Parque Serra de Ricardo Franco, a dilapidação dos nossos paraísos naturais como Chapada dos Guimarães com suas plantações de soja no topo do morro. As atrocidades são inumeráveis. As hidrelétricas que sufocam nossos rios e assassinam o modo de vida dos nossos povos tradicionais, como Belo Monte na Volta Grande do Rio Xingu e as construídas ao longo do rio Teles Pires em Mato Grosso (falo sobre isso aqui). Mas o projeto político é esse, é o que vemos com o desmonte da Fundação Nacional do Índio (Funai) e de políticas públicas voltadas para preservação e conservação do meio ambiente e do modo de vida das populações tradicionais. Todas essas questões estão relacionadas.

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Enquanto não nos perguntarmos a quem beneficia essa produção indiscriminada de riqueza e a qual preço, continuaremos sintonizados neste reality show, inertes, sem pensar que o custo é a nossa própria existência.

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Marianna Marimon, 30, escritora antes de ser jornalista, arrisco palavras, poemas, sentidos, busco histórias que não me pertencem para escrever aquilo que me toca, sem acreditar em deuses, persigo a utopia de amar acima de todas as dores. Formada em jornalismo (UFMT) e pós-graduação em Mídia, Informação e Cultura (USP).

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