A escrita de Carola traz o inusitado como imanente, e o espírito do leitor parece ser convidado a um mergulho no inconsciente em busca de compreender o inalcançável. Quando gosto de um autor procuro perseguir a sua obra e, na medida do possível, mantenho acesa a chama. Talvez seja por isso essa vontade de mergulhar mais fundo no conjunto, atravessar os planos, sobreviver ao transe para que o objetivo se concretize.
Acerca de sua paisagem idílica em uma ilha deserta em algum ponto do planeta terra, cercada de água por todos os lados e povoada por dromedários, com suas corcovas, encontra-se esta obra. Estou diante de uma sinfonia. Não ouço, mas de maneira harmônica ela acontece. Há sobressaltos entre os metais. Um certo apelo pelas cordas. Ruflar dentre os componentes percussivos. Os arranjos vão se sucedendo. Tom sobre tom. E a paisagem lunar recobre as semicolcheias.
A arte, como imagem, parece uma obsessão, e o objeto se constrói pelo olhar do espectador, do leitor. E ele desanda a percorrer os caminhos do significado, atrás dos significantes e a busca pela interpretação. Uma ilha. O tal objeto desossado diante de outra ilha: de edição. Aquela ilha que conta os bastidores da história e traduz o enredo, outro tipo de arranjo. Adição.
E surgem outras imagens, um arquipélago de sensações. A sinfonia de um náufrago em busca de seu porto seguro. “Arte não é o objeto, é o contexto, e o contexto quem decide é você” (SAAVEDRA, 2010, p. 13). Mas não vejo dromedários na paisagem, como não via cemitérios de elefantes, em Dalton Trevisan, ratos em Zola. Zoomorfizados, seguimos viagem pelo plano do texto ignorando contextos.
Preciso de um outro parágrafo para falar de Camila, de Laura, deixa ver. O motorista do sonho, as telas de cinema, o roteiro. Buenos Aires, Frankfurt, Botafogo. Algumas partes falsamente pueris, poesia pura. A mentira. O cara do cinema, como era mesmo o nome do cara do cinema? A utilização do verbo repetidamente, após a vírgula, elemento da terapêutica octaviana. 2012 já passou há algum tempo, e nem me lembro o que eu esperava dele.
O que dizer dos polissíndetos tão necessários, das enumerações intensas, do discurso indireto livre seguro e preciso na direção do discurso. Mas que discurso, qual dos discursos? Eu nem sabia o que era sanca de gesso. E agora fico a pensar nas palavras de Camila, quase ao final do livro, sobretudo quando diz a Laura que
… suas palavras nunca perdiam o excesso, o tom ostentoso, como se fizessem parte da decoração, do jantar, sem conseguir entender por que eu pensava essas coisas, quando o mais simples era estar ali e ficar contente com a amizade, a delicadeza de Laura (SAAVEDRA, 2007, p. 149).
Sempre gostei das terças-feiras, longe do estigma da preguiça que a ideia da segunda traz, ou do descanso embutido na sexta, como o tédio dos domingos que antecede mais uma semana de trabalho. A terça é livre para se reinventar. Bom para uma sessão com seu terapeuta, ou uma de cinema com alguém que te queira, um encontro com aquela pessoa que desejas muito, ou menos um pouco.
REFERÊNCIA
[…] palavras, de certa forma, me pertenciam. Esse envolvimento é o que causa um verdadeiro romance. Carola Saavedra tem essa sensibilidade de nos transportar para dentro de suas páginas. A escritora é considerada […]