Há quem diga que o cinema brasileiro não tem muitos filmes bons, já eu penso que quem diz isso é porque não conhece nada do que produzimos por aqui. Em um país tão grande e rico em diversidade cultural, é quase impossível não encontrarmos boas opções dentro do cinema. Uma das regiões que me atrai em todos os sentidos, e principalmente por ter uma produção audiovisual carregada de poesia e sensibilidade, mas que ao mesmo tempo sabe ser “arretada”, é o Nordeste. Por isso, fizemos esse compilado de filmes nordestinos pra você desfrutar e enxergar o nosso cinema com outros olhos.
Febre do Rato (2011)
Com direção do aclamado – e famoso pelos seus filmes com cenas escancaradas e de certa forma agressivas aos olhos de parte do público – Cláudio Assis, e fotografia de Walter Carvalho, “Febre do Rato” é um filme todo em preto e branco que contempla um cenário típico nordestino. Protagonizado por Irandhir Santos, que vive o escritor Zizo, um poeta sonhador que toca um pequeno e caseiro jornal-manifesto – que leva o mesmo nome do filme – na cidade.
Em sua trajetória na trama, embalado por poesia e discussões libertárias, subversivas e anarquistas sobre a vida, Zizo passa a ter outro olhar sobre as coisas do mundo quando conhece e se apaixona por Eneida, personagem interpretada por Nanda Costa. O filme carrega em sua fotografia e narrativa um tom poético e filosófico sobre a vida, ao mesmo tempo que provoca e expõe o lado mais cru do ser humano em corpos nus explorados em diversos ângulos.
Cinema, Aspirinas e Urubus (2005)
Um encontro entre dois homens de universos bem distintos desenrola as linhas desse longa lançado em 2005 e dirigido por Marcelo Gomes. Em meio ao cenário do sertão nordestino, em 1942, o caminhoneiro e vendedor de aspirinas Johann – um alemão fugido da 2ª Guerra Mundial –, interpretado por Peter Ketnath, dá carona para o nordestino Ranulpho, o qual passou a sua vida inteira no sertão e é vivido na pele do ator João Miguel. Os dois seguem os caminhos da vida passando de vila em vila apresentando um filme promocional para a venda das benditas aspirinas.
O enredo é levado pela discrepância entre os dois mundos, do estrangeiro que abre os olhos do povoado regional para o novo, trazendo os surpreendentes efeitos do remédio junto ao universo incrível do cinema, e do simples homem nascido no interior do nordeste, que carrega dentro de si toda ingenuidade de quem viveu fechado em seu mundo. Mas nada disso impede o surgimento de uma amizade em torno da trama, onde se vê que mesmo quem parece “não ter nada pra dar” consegue trazer uma troca sincera de conhecimentos e experiências.
Bacurau (2019)
Um ambiente emblemático e curioso faz o tom do longa de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. Bacurau dá não só nome ao filme mas à cidade também, e começa logo com a morte e o velório da matriarca Carmelita, interpretada pela atriz Lia de Itamaracá. A partir daí, situações estranhas começam a acontecer, incluindo o desaparecimento da cidade de todos os mapas possíveis, o surgimento de cadáveres e drones não identificados rondando a região.
Parte do povoado se une para desvendar os mistérios que assolam os últimos dias e descobre que um ataque está acontecendo, basta descobrir quem são os inimigos e encontrar uma maneira de se defender. O que não se espera ao longo da trama, é que Bacurau não é tão inocente quanto parece e as pessoas que vivem ali carregam muito mais segredos do que se pode imaginar. O longa-metragem conta com a atuação de Sônia Braga como Domingas, Barbara Colen como Teresa – neta de dona Carmelita –, o ator alemão Udo Kier, como o vilão Michael, e Silvero Pereira como Lunga.
O Céu de Suely (2006)
Iguatu, sertão cearense, Hermila tem 21 anos e retorna para sua cidade natal após passar um tempo em São Paulo. Ela chega junto de seu filho, o pequeno Mateuzinho, com a promessa de que o namorado – que leva o mesmo nome do filho, Mateus – também voltará em breve. A atriz Hermila Guedes é quem carrega no rosto e nos ombros o peso da vida de nossa personagem nesse filme dirigido por Karim Ainouz, com direção de fotografia de Walter Carvalho. Acontece que, ao voltar para Iguatu, Hermila se encontra com seu passado e sente que voltou alguns passos na vida, levando aquele desejo imenso de ir embora dali.
Quando ela entende que foi abandonada pelo namorado e que precisará, a partir dali, tomar as rédeas de seu próprio futuro, Hermila, que agora é Suely, bola um plano e decide fazer uma rifa em que o prêmio é ela mesma. Escolhas difíceis sempre trazem grandes perdas quando a mudança é profunda, mas trazem também a possibilidade de se criar novas linhas nessa história.