Acusado por muitos por fazer uma música burra e embrutecedora, o Motorhead tem longa história e extensa folha de serviços prestados ao rock e acreditem, raras foram as bandas como o Motorhead, que resistiram ao tempo sem ceder às pressões do mercado, e sem se desviar de seu ideal e caminho traçado no inicio de sua vitoriosa jornada.
O Motorhead, ao contrário de tudo e todos, atravessou em grande estilo os anos 1980 e 1990, conseguindo com isso a enorme façanha neste mundo volátil do rock: ser respeitado como um dos principais (para muitos o principal) grupos da chamada música pesada, indo muito além de sua importância histórica. Apesar das várias mudanças em sua formação ao longo dos anos, ficando apenas Lemmy Kilmister como membro constante, o grupo jamais desviou de sua meta e trajetória, permanecendo fiel ao seu estilo. O que explica em parte, sua longevidade e admiração de seus milhares de fãs.
Furiosamente rápido e alto o estilo Motorhead virou patente de centenas de grupos que incorporaram a maneira Motorhead de ser. Quando a banda surgiu em meados dos anos 70, marcou uma das vertentes mais marcantes do que foi chamado “Heavy Metal“. Seu líder, Lemmy Kilmister, foi membro de uma banda que é considerada pilar do “Hard space rock“ a Hawkwind. Mas, foi no Motorhead que o som amplificou-se e mostrou ao máximo adicionando elementos próprios do então emergente punk rock.
Punk Rock :
Embora bandas do mundo do Punk Rock como Sex Pistols e The Damned fossem consideradas bandas de respeito deste gênero, é creditado ao Motorhead a criação do gênero. Engano. O Motorhead nada teve a ver com esse gênero, do qual souberam guardar uma distância considerada sábia, pois o chamado Punk Rock ruiu depois de pouco mais de dois anos de turbulência e pouca aceitação, enquanto o Motorhead e o rock pesado tiveram e tem fôlego para se manter ativos e fortes até os dias de hoje.
Mesmo na mais importante das questões, a chamada imagem, o Motorhead, que é bom lembrar, se formou alguns anos antes do Punk dar seus primeiros uivos, cultivava a aparência do rockers/motoqueiros radicais, com roupas de couro e cabelos longos, longe de modismos, fazendo assim com que o grupo se tornasse o que de mais enérgico existiu em termos de speed metal e thrash metal.
Lemmy :
Baixista e vocalista do Motorhead, alem de seu criador e virtual líder, Lemmy Kilmister, nasceu em 24 de dezembro de 1945, em Stoke-on-Trent, Staffordshire, Inglaterra, e recebeu o nome de Ian Fraiser Kilmister. O apelido Lemmy veio bem depois, quando já era músico, por causa da mania compulsiva de pedir dinheiro emprestado a todo mundo “Lemme a fiver “ = Me empresta cinco pratas – era sua frase mais comum. Lemmy começou a tocar rock em 1964, na cidade de Blackpool, Inglaterra, fazendo parte de duas bandas de Rhythm & Blues da região, chamadas The Rainmakers e The Motown Sect – No decorrer dos anos 60 Lammy participou de várias bandas, além de ter trabalhado por um breve período como roadie de Jimi Hendrix. Em 1971, Lemmy foi convidado a participar do Hawkwind. A princípio, estabeleceu-se que ele ficaria na banda por seis meses, tempo esse que se estendeu por 4 anos. Lemmy acabou expulso da banda em 1975, ao ser detido no Canadá por porte de entorpecentes. Foi liberado depois de cinco dias, pois verificou-se que acusação de tráfico não procedia e suas drogas não eram nada além de pequena porção de anfetamina. Porém, até seus últimos momentos Lemmy teve sua imagem ligada ao consumo de drogas, ele era insone capaz de passar muitas horas sem dormir e nem descansar e por isso usava remédios para poder repor energias.
Mas, depois do acontecido no Canadá, Lemmy voltou à Inglaterra e formou nova banda que tinha o nome de “Bastard“, mais tarde rebatizada de Motorhead, que é nome de uma canção que ele fez para o Hawkind, gravada em 1975. Vale lembrar que Motorhead era uma gíria constantemente usada para viciados em Speed, comprimidos estimulantes. Lemmy chamou o guitarrista Larry Wallis vindo de uma banda cult, The Pink Fairies, e a eles se juntou o baterista Lucas Fox. A estreia do Motorhead se deu em 1975, abrindo shows do Greenslade, na época uma respeitada banda de rock progressivo. Já em setembro deste ano o Motorhead começou a gravar o seu primeiro álbum para o selo United Artists, porém, a banda e seu produtor Dave Edmunds se desentenderam e, como resultado, o álbum foi suspenso.
As gravações desse álbum foram recuperadas e editadas somente em 1979, com uma produção de Fritz Fryer, e tinha o titulo de On Parole. Vale lembrar que a confusão com a mudança de gravadora e uma série de quebras nas regras fez com que as primeiras gravações do Motorhead surgissem em vários selos diferentes.
As primeiras mudanças do Motorhead aconteceram já no final de 1975: Lucas Fox deixou a banda, sendo substituído por Phyltney Animal que vinha de uma banda que se chamava Blue Goose. De lá chegou Fast Eddie Clark, também da Blue Goose, que imediatamente se juntou ao grupo. Depois de apenas um ensaio como quarteto, Larry Wallis abandonou a banda, fazendo o Motorhead voltar a ser um Power trio.
Dessa fase um único compacto foi editado, Deus sabe como, em meados de 1977, para um selo promissor que se chamava Stiff Records, de Jack Rivera, que estava iniciando suas atividades e que, em breve, se tornaria a mais importante das gravadoras independentes da Inglaterra. A Stiff tinha vocação e predileção pelo que parecia grotesco e bizarro o o Motorhead entrou para o cast justamente por representar o que na época chamou-se o Pior Grupo de Mundo, tudo isso depois de uma desastrosa apresentação no Hammersth Odeon como banda de apoio do Blue Oyster Cult, na época a banda queridinha da imprensa especializada.
O mundo ruiu para o Motorhead, tanto que foi marcado um show de despedida da banda no The Marquee Club em Londres. Ted Carrol manager da Chiswick Records prometeu gravar o show, coisa que acabou não acontecendo, mas em compensação ele ofereceu ao grupo um tempo em estúdio para que eles fizessem um demo ou até um compacto. Tempo esse que foi aproveitado ao máximo, pois ali foi criado e gravado um single histórico “City Kids“, e também o primeiro álbum “Beer Drinkers”, Ted Carrol gostou do que ouviu e ofereceu à banda um contrato e mais horas de estúdio, salvando a banda de um final melancólico. Finalmente o talento e a determinação da banda começava a ser ouvida e mais do que isso recompensada.
Motorhead e suas parcerias produtivas
O álbum homônimo pela Chiswick, de setembro de 1977, resistiu ao massacre da crítica, rádios e outros, e entra nas paradas como um dos mais vendidos. A arte da capa (de Joe Petagno) deu ao grupo a identidade visual que faltava. O rompimento com a Chiswick, logo após a edição do álbum, acabou sendo tumultuado pois não faltaram acusações de ambas as partes, aliás, fato esse normal no relacionamento da banda com gravadoras, empresários, e até mesmo fãs. Era o momento de seu segundo álbum e ele veio com o nome de “Overkiil“ em março de 1979 pela Bronze. Embora com destaque o álbum Overkill teve seus percalços pois foi alvo de críticas à produção feita por Jymmi Miller considerado conservador. Resultado 60 mil cópias e a banda sai pela primeira vez em turnê pelo pais. Se mostrando a todo o país o Motorhead lança em 1979 “Bomber“, álbum muito bem produzido (aí sim, aplaudido pelos fãs). Seguiram-se álbuns que definitivamente colocaram o Motorhead no topo, como “Ace of Spades” e tantos outros LPs que foram muito bons para a afirmação da banda. Mas, em 17 de abril de 1982, é lançado “Iron First“ que dá a impressão que o fim está próximo pois a banda perdia muito de seu pique, mas, a banda consegue se reagrupar e até voltar ao sucesso graças a determinação e ao talento de seus músicos, destaque para Lemmy Kilmister.
Wendy O. Williams do Plasmatics, junta-se ao Motorhead para a gravação do LP “Stand by Your man, com outros hits country, nesse momento de escolha de repertório Eddie Clark discorda das musicas escolhidas para o disco, se desliga do Motorhead e vai tocar no Farway, banda que faz sucesso discreto nos anos 80. Daí, começa a dança de músicos para substituí-lo, iniciando com Brian Robbo Robertson, que veio do Thin Lyzzi. A escolha é surpreendente, pois Robbo tem estilo virtuoso considerado limpo demais para o som do Motorhead.
Robbo, além de se recusar a tocar os clássicos da banda, veste-se em desacordo com o jeito Motorhead de ser. Mesmo provocando revolta entre fãs radicais, Robbo ficou até o final de 1983, dando tempo de gravar “Another Perfect Day“, editado em 1983. Com a saída de Robertson, entra o guitarrista Philip Campbell. Pouco tempo depois, em fevereiro de 84, Phil Taylor sai da banda, sendo substituído por Peter Gill, que veio do Saxon.
Novos trabalhos se sucedem e o álbum seguinte “No Remorse“ traz uma compilação de sucessos com 4 novas faixas, e marca definitivamente o final de uma época conturbada do Motorhead. Depois de mais uma troca de gravadora, agora a banda vai para GWR e faz seu grande álbum “Orgasmatron“, em 1986, álbum produzido por Bill Laswell, e em seguida já lança “Rock’ n Roll” em 1987 – mostrando a todos que o poder de criação do grupo continuava afiadíssimo.
A volta, o fim, e tudo mais!
O baterista Phil Taylor reintegra-se à banda em meados de 1987, permanecendo ate 1992. O álbum seguinte é gravado ao vivo, “No Sleep at All“, editado em outubro de 1988, com a formação: Lemmy (vocal/baixo), Phillip Campbell (guitarra) e Phil Taylor (bateria), o disco faz relativo sucesso. Em seguida, o Motorhead iria assinar pela primeira vez, com uma grande gravadora (SONY), porém, as negociações se arrastaram por um longo tempo. Finalmente acertadas as bases com a nova gravadora (WTG, subsidiária da Sony), Lemmy se muda para Los Angeles, para o lado Oeste de Hollywood. Na época, o Motorhead ficou dois anos sem trabalhar absolutamente nada.
Lemmy aproveitou esse tempo para escrever músicas para Rita Ford e principalmente para Ozzy Osbourne, inclusive dando origem ao bem sucedido álbum “No More Tears“. Finalmente, em fevereiro de 1991, sai o esperado novo álbum “1916“ pelo selo Epic/Sony, com destaque para duas músicas “Going to Brazil e RAMONES“. A banda sai em turnê com nome de Operations Rock’n Roll acompanhado de Judas Priest e Alice Cooper. Pela primeira vez, o Motorhead é indicado para o Grammy (por “1916”) e acaba perdendo para o Metallica. O segundo e último álbum para o selo Epic sai em agosto de 1992, com o titulo Marcho r Die, com participações especiais de Slash (Guns N Rose), Ozzy Osbourne e Mike Dee, baterista que havia participado de alguns trabalhos anteriores do Motorhead.
De volta ao início
A Sony desativa a WTG e o Motorhead se vê novamente sem contrato. Desapontados, acabam produzindo o álbum “Bastards“, de forma independente. O álbum sai em novembro de 1993, porém, o CD chega com muito atraso às lojas e o álbum fracassa, apesar de muito bem tocada em rádios do mundo inteiro. Novamente na luta, a banda faz o álbum “Sacrifice“ em outubro de 1995 pela CMC International, marcando a despedida do guitarrista Wurzel. A banda mais uma vez volta as origens e se torna um trio, com Lemmy, Campbell e Dee, que se manteve até a morte de Lemmy (28 de dezembro de 2015).
Ainda em 1996, sai o álbum “Overnight Sensation“, com imagens da banda fato esse raro pois era difícil fazer os rapazes posarem para fotos. Nos anos seguintes a banda se manteve viva com algumas turnês .
Ponto final: fracasso e sucesso se abraçam e colocam as coisas no seu devido lugar
Referência inspiradora para centenas de bandas iniciantes os Motorhead’s são imbatíveis titãs do metal, para a felicidade de uma legião de admiradores que se espalham planeta afora.
*Paulo de Tarso, pesquisador e produtor musical,radialista e jornalista,palmeirense
cheio de esperança para o ano do Porco - versão 2017.