“O projeto de masculinidade hoje é um projeto falido. O máximo que um homem pode fazer é jogar fora as referências que teve. O que cabe no lugar? Vamos ter que construir”, (Tales – Carta Capital – reportagem de Thaís Chaves)
Muito bacana ver que grupos de homens vêm se formando para colocar no centro da pauta, a masculinidade. O significado disso para trás, a ressignificação disso, avante, para frente! Como nos comportamos em relação às mulheres, qual o nosso papel na reconstrução das relações sexuais, afetivas, solidárias, de companheirismo, no trabalho, na divisão das coisas do mundo, em todas as relações possíveis, e até aquelas que serão inventadas ainda?
Vejo relatos que passam pela angústia, pela nossa formação enquanto seres masculinos, nossos corpos, suas marcas e consequências. As vozes severas e dominantes dos machos de plantão que nos conduziam para práticas abusivas, agressivas e até violentas. Ao rememorar, do ponto de vista pessoal, minha própria história vejo quantas deformações nesse processo formativo, nos vacilos, nos abusos, nas inconsequências com que praticamos coisas que são normalizadas pelo discurso tóxico masculino. Como errei, como erramos nessa trajetória!
E agora, sentimo-nos impulsionados para as mudanças, que são drásticas até, às vezes, mas que são muito mais que necessárias, são a base de um presente-futuro em que é preciso primeiro desconstruir essas práticas que estão tão arraigadas no universo do ser masculino: menino não deve chorar, (em uma experiência de grupo, que li na Carta Capital, Matheus conta que um dos encontros do grupo Ressignificando Masculinidades, que lhe foi mais importante foi sobre choro. “Estava em um momento da minha vida que mesmo estando frustrado, não conseguia chorar”, desabafa. Ele conta que os colegas o ajudaram a entender o porque ele não conseguia chorar, e passaram a entender o ato como algo que lhes foi negado toda a vida simplesmente por serem homens).
E lá vão os comandos que dizem o que podemos e o que não podemos: menino não pode gostar de poesia, isso é coisa de meninas; menino não pode estudar piano, fui aluno de piano, eu sozinho, no meio de dezenove meninas; menino tem que brigar, resolver seus problemas lá na rua, não voltar para casa desmoralizado com uma surra, senão apanha de novo; menino tem que fazer sexo com prostitutas até os quatorze anos; menino tem que ser dominante; menino tem que ser macho!
Caramba, meninos são vítimas nessa história toda, fico a pensar: e as mães, por que não intercedem, por que não assumem outra forma de lidar com a casa, com a condução da vida de seus filhos e filhas? Mas tá lá a presença do marido, dos empregados sujeitos a suas ordens e ordenamentos econômicos, sujeitos ao chefe da casa, submissos, então forma-se uma cadeia de fatores que colocam a mãe numa condição de eterna vigilância em seus domínios, e fica com aquela falsa sensação de que elas dominam o ambiente, no máximo tem o domínio da limpeza da casa, da cozinha, da limpeza e higiene pessoal das crianças, organizam as festas e encontros familiares, organizam o vestuário, organizam a casa de um modo geral. Não sei se coloco no tempo presente, ou isso já é passado? Que está mudando não tenho dúvida. as mulheres estão assumindo protagonismos, isto é fato. Apesar de os dados apontarem que a violência contra a mulher também cresce.
As inseguranças com a sexualidade também fazem parte das discussões nos diversos grupos masculinos que vêm se formando. “Começa como brincadeira, por conta do tabu, e depois o pessoal vai levando mais a sério”, admite Lucas. Sobre os próprios corpos, há a pressão pelo corpo sarado e preocupação com a performance na hora H. Chegam a culpar a indústria pornográfica que mostra desde cedo situações ficcionais de um desempenho sexual de sempre muito sucesso. Para eles, a pressão vem desde cedo. “Com 10 anos, já comecei a ouvir do meu pai que eu precisava ‘começar a ver umas coisas aí’”, evidencia Lucas.
Também está na realidade relatada nos grupos a pressão para que homens a todo o tempo queiram transar, o preconceito com o ponto G, o uso desnecessário de remédios como Viagra e a falta de debate sobre a importância dos preservativos.
Outro ponto de polêmica é o assédio. “Muitos ainda têm a visão de que só é estupro se houver uma maldade”, expõe Lucas. “Os rapazes ainda têm muito medo de serem expostos”, conclui.
Ele se considera um ‘machista em tratamento’, termo inventado por Sérgio Barbosa, coordenador do grupo de discussão Tempo de Despertar.
Não podemos mudar o passado. Mas, podemos sim aprender com os erros que cometemos. Isto sim é uma oportunidade de renascimento e de reconstrução de nós mesmos.